Temer vê 'infâmia', afirma que não há provas e diz que denúncia é 'ficção'

Ao lado de aliados, presidente fez pronunciamento no Planalto para se defender de denúncia de corrupção contra ele apresentada nesta segunda-feira ao STF pelo procurador-geral da República.

temer1O presidente Michel Temer afirmou na tarde desta terça-feira (27) que não há provas concretas na denúncia por corrupção passiva contra ele apresentada nesta segunda (26) ao STF pela Procuradoria Geral da República. Segundo ele, a peça acusatória é uma "ficção" (veja e leia a íntegra do pronunciamento).

Foi a primeira fala de Temer desde que a denúncia foi apresentada, na noite desta segunda. Ele fez o pronunciamento no Salão Leste do Palácio do Planalto. O presidente chegou ao local acompanhado de diversos ministros e parlamentares da base aliada, que se postaram de pé ao lado do presidente em sinal de apoio.

Veja os principais argumentos utilizados pelo presidente no pronunciamento:

  • Disse que é vítima de infâmia.
  • Cobrou provas concretas.
  • Afirmou que a denúncia é "frágil" e peça de "ficção".
  • Atacou a PGR e disse que ex-procurador se tornou advogado da JBS.
  • Disse que os acusadores reinventaram o Código Penal e criaram "denúncia por ilação".
  • Afirmou que o "senhor grampeador" Joesley Batista é criminoso.
  • Disse que gravação de conversa com Joesley é "prova ilícita".
  • Criticou o fatiamento da denúncia e disse que a PGR quer "paralisar o país".

"Eu tive ao longo da vida uma vida, graças a Deus, muito produtiva e muito limpa. E exatamente neste momento, em que nós estamos colocando o país nos trilhos, é que somos vítimas dessa infâmia de natureza política. [...] Eu fui denunciado por corrupção passiva. Notem, vou repetir a expressão, corrupção passiva a essa altura da vida, sem jamais ter recebido valores. Nunca vi o dinheiro e não participei de acertos para cometer ilícitos. Onde estão as provas concretas de recebimento desses valores? Inexistem", afirmou o presidente.

"Onde estão as provas concretas de recebimento desses valores? Inexistem."

Na denúncia, Rodrigo Janot afirmou que as provas de que Temer recebeu dinheiro de propina são "abundantes". Antes da denúncia, em um relatório elaborado após as investigações, a Polícia Federal afirmou que as provas colhidas no inquérito indicam "com vigor" que Temer praticou corrupção.

"Criaram uma trama de novela. Eu digo, sem medo de errar, que a denúncia é uma ficção. [...] Tentaram imputar a mim um ato criminoso e não conseguiram porque não existe, juridica ou politicamente", complementou.

"Criaram uma trama de novela. Digo sem medo de errar que a denúncia é uma ficção."

Em outro momento do pronunciamento, Temer se disse tranquilo, do ponto de vista jurídico. Isso porque, para ele, não há fundamentos que embasem a denúncia.

"Eu não me impressiono, muitas vezes, com os fundamentos, ou quem sabe até a falta de fundamentos jurídicos, porque advoguei por mais de 40 anos. Eu sei bem como são essas coisas. Eu sei quando a matéria é substanciosa, quando tem fundamentos jurídicos e quando não tem. Então, sob o foco jurídico a minha preocupação é mínima", afirmou o presidente. Segundo ele, acrescentou-se ao direito penal "uma nova categoria: a denúncia por ilação".

"Tenho orgulho de ser presidente. [...] Não sei como Deus me colocou aqui."

No discurso, o presidente afirmou que não lhe falta coragem para "seguir na reconstrução do país" e disse que tem "orgulho" de ser presidente.

"Eu tenho orgulho de ser presidente, convenhamos, é uma coisa extraordinária. Para mim é algo tocante, é algo que não sei como Deus me colocou aqui. Dando-me uma tarefa difícil, mas certamente para que eu pudesse cumpri-la. Portanto, tenho a honra de ser presidente, especialmente, não porque sou presidente, mas é pelos avanços que o meu governo praticou.. [...] Não me falta coragem para seguir na reconstrução do país, e convenhamos, na defesa da minha dignidade pessoal", concluiu.

Janot

O presidente dedicou parte do pronunciamento a atacar o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Ele disse que, se quisesse usar o método da “ilação”, poderia levantar suspeitas sobre o ex-vice-procurador, Marcelo Miller, que, segundo afirmou, é ligado a Janot.

Marcelo Miller integrou a força-tarefa da Operação Lava Jato até pouco antes de o empresário Joesley Batista e outros executivos da holding controladora do frigorífico JBS fecharem acordo de delação premiada. Ele deixou a PGR em março e foi trabalhar no escritório de advocacia contratado pela JBS para fechar o acordo de delação premiada.

“Eu dou o nome desse procurador da República, Marcelo Miller, homem da mais estrita confiança do procurador-geral. Pois bem. Eu, que sou da área jurídica, digo a vocês que o sonho de todo acadêmico em Direito, de todo advogado era prestar concurso para ser procurador da República. Pois bem. Esse senhor que eu acabei de mencionar deixa o emprego, que é o sonho de milhares de jovens, acadêmicos, abandona o Ministerio Público para trabalhar em uma empresa que faz delação premiada para o procurador”, disse Temer.

Temer disse que Miller não cumpriu quarentena (período que um servidor tem de aguardar após deixar o serviço público e antes de ingressar no setor privado). "O cidadão saiu e já foi trabalhar, depois de procurar a empresa para oferecer serviços, foi trabalhar para esta empresa e ganhou, na verdade, milhões em poucos meses", afirmou.

Para Temer, Marcelo Miller "garantiu ao seu novo patrão, o novo patrão não é mais o procurador-geral, é a empresa que o contratou, um acordo benevolente, uma delação que tira o seu patrão das garras da Justiça, que gera, meus senhores e minhas senhoras, uma impunidade nunca antes vista", declarou. "E tudo ratificado, assegurado pelo procurador-geral".

À noite, Marcello Miller divulgou comunicado no qual disse que somente se manifestará sobre as declarações de Temer "perante as autoridades".

"Não cometi nenhum ato irregular, mas não responderei às afirmações a meu respeito pela imprensa. Apenas me manifestarei perante as autoridades com competência para examinar os fatos e com interesse na aferição da verdade", disse.

'Ilações'

O presidente também afirmou que poderia fazer "ilações" em relação ao destino da remuneração do ex-procurador, mas que não faz porque não pode "ser irresponsável".

"Pelas novas leis penais, que eu estou dizendo da chamada ilação, ora criada nesta denúncia, que não existe no Código Penal, poderíamos concluir nessa hipótese que estou mencionando, que talvez os milhões de honorários recebidos não fossem unicamente para o assessor de confiança, que, na verdade, deixou a Procuradoria para trabalhar nessa matéria. Mas eu tenho responsabilidade. Eu não farei ilações. Não farei ilações. Eu tenho a mais absoluta convicção de que não posso denunciar sem provas. Não posso fazer, portanto, ilações. Não posso ser irresponsável", declarou Temer.

O presidente disse ainda que a "embriaguez da denúncia" apresentada por Janot "busca a revanche, a destruição e a vingança".

Outras denúncias

Além da denúncia por corrupção, Temer e Rocha Loures são investigados em inquérito por obstrução de justiça e organização criminosa. Por isso, existe a possibilidade de que, nos próximos dias, ambos sejam alvos de duas novas denúncias da PGR.

No pronunciamento, o presidente criticou o eventual fatiamento da denúncia. Para Temer, a estratégia de Rodrigo Janot visa "paralisar o país".

"Ainda se fatiam as denúncias para provocar fatos semanais contra o governo. Querem paralisar o país, querem paralisar o Congresso num ato político com denúncias frágeis e precárias".

"Ainda se fatiam as denúncias para provocar fatos semanais contra o governo. Querem paralisar o país, querem paralisar o Congresso num ato político com denúncias frágeis e precárias", criticou Temer.

Ao finalizar o discurso, Michel Temer disse que não permitirá que o acusem de crimes. "Não fugirei das batalhas. Nem da guerra que temos pela frente".

Entre os parlamentares presentes ao pronunciamento do presidente estava Alceu Moreira (PMDB-RS), um dos cotados para ser indicado relator da denúncia contra Temer na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Também compareceram, entre outros, os deputados Nelson Marquezelli (PTB-SP), Ricardo Izar (PP-SP), Jovair Arantes (PTB-GO), Darcísio Perondi (PMDB-RS), Hugo Motta (PMDB-PB), Mauro Pereira (PMDB-RS), Izalci Lucas.(PSDB-DF), Pedro Paulo (PMDB-RJ) e Alfredo Kaefer (PSL-PR), além do presidente do Conselho de Ética da Câmara, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA).

A acusação formal contra ele foi enviada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal Federal (STF) na noite de segunda-feira (26), por volta das 20h.

No mesmo dia, Temer se reuniu a portas fechadas com ministros e aliados políticos até pouco depois das 23h. Nesta terça, a habitual reunião pela manhã no gabinete presidencial com assessores e ministros próximos não foi realizada. Temer permaneceu durante a manhã no Palácio do Jaburu, residência oficial da Vice-Presidência, local onde reside.

É a primeira vez na história do Brasil que um presidente da República foi denunciado por corrupção durante o exercício do mandato.

Antes de a denúncia ser apreciada pelo STF, caberá à Câmara (primeiro, na CCJ e, depois, no plenário) decidir sobre o prosseguimento da acusação.

A denúncia

A denúncia foi baseada na delação de executivos da JBS. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirma que, "com vontade livre e consciente", Temer "recebeu para si, em razão de sua função", por intermédio do ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), atualmente preso, R$ 500 mil oferecidos pelo grupo J&F, ao qual pertence o frigorífico JBS, do empresário Joesley Batista.

Além disso, de acordo com a acusação, Michel Temer e Rocha Loures aceitaram ainda a promessa de vantagem indevida no montante de R$ 38 milhões para atuação em defesa dos interesses da empresa.

O Ministério Público Federal reconstituiu todos os fatos, do encontro entre Joesley Batista e Temer no Palácio do Jaburu até a entrega de uma mala com R$ 500 mil a Rocha Loures em São Paulo.

Fonte: G1