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Funkeiros viram alvo da polícia a pedido de deputado que rasgou placa de Marielle

Rodrigo Amorim (PSL-RJ) nunca foi investigado por destruir homenagem a vereadora assassinada, mas bastou um pedido dele para a Polícia Civil investigar MCs Cabelinho e Maneirinho por apologia ao crime 

 Dois funkeiros são investigados pela Polícia Civil do Rio de Janeiro por “apologia ao crime”. A iniciativa tem como base notícia-crime de um deputado do PSL contra os MCs Cabelinho e Maneirinho.

Os funkeiros usaram suas redes sociais para denunciar a situação. Cabelinho prestou depoimento nesta quinta-feira (29/10), enquanto Maneirinho foi intimado a prestar esclarecimentos à Civil.

A corporação abriu as investigações devido à uma notícia-crime aberta pelo deputado estadual Rodrigo Amorim, do PSL. Em 2018, ao lado do então candidato ao governo do RJ Wilson Witzel, Amorim quebrou uma placa em homenagem à vereadora Marielle Franco, assassinada a tiros.

Em sua conta no Twitter, o deputado, que foi o parlamentar estadual mais votado do pleito de 2018 no Rio, comemorou a intimação dos MCs. No Facebook, Amorim também postou um vídeo onde chama os funkeiros de “vagabundos travestidos de artistas”.

O funkeiro defensor de drogas e bandidos foi intimado a depor por causa de ofícios que enviei à @PCERJ? Que pena!https://t.co/WxX7H8e9g4 pic.twitter.com/BdtrH0FJtC

— Rodrigo Amorim (@RJRodrigoAmorim) October 29, 2020

Em ofício enviado em julho deste ano para a Comissão de Defesa dos Diretos da Mulher da Alerj, Rodrigo detalha ter denunciado, alémde Maneirinho e Cabelinho, a cantora Ludmilla. Não é a primeira vez que um deputado ataca Ludmilla: o deputado federal Cabo Junio Amaral (PSL-MG) tentou acionar o MPF contra a cantora em dezembro de 2019, também por apologia, mas teve seu pedido rejeitado. Em setembro, Ludmilla entrou com ação no STF contra Junio, acusando o parlamentar de calúnia.

Cabelinho publicou um texto em sua página na rede social Instagram logo depois da ida à polícia. Ao desabafar que negros vindos de favela que conseguem sucesso “para essa gente só pode ser bandido”, atacou as políticas públicas oferecidas às comunidades.

“O Estado nunca me deu nada, pelo contrário: patrocina há décadas o genocídio do meu povo”, disparou, ao citar que existe “uma Agatha e um João Pedro não noticiados por semana” – referência a crianças mortas durante ações em favelas das polícias do RJ.

Cabelinho citou o caso de Rennan da Penha, DJ condenado e preso por sete meses em 2019 sob acusação de apologia ao tráfico, como exemplo de perseguição aos jovens negros de periferia e a cultura funk.

“O que eles querem, de verdade, é prender o que a gente presenta”, afirma. “Quer que eu cante sobre o que, que eu fale sobre o que? Em muitas das minhas letras retrato o que eu vi e vivi, o cotidiano violento de todo morador de comunidade”.

 Maneirinho está um passo atrás de Cabelinho nas investigações, pois recebeu intimação da Polícia Civil para ir prestar depoimento. Também em seu Instagram, o funkeiro publicou o documento com sua convocação.

A investigação segue a mesma linha da feita com Cabelinho: apologia ao crime, em denúncia do mesmo deputado. Nas redes, ele pediu ajuda aos seguidores que acompanham seu trabalho.

“Não posso ser vítima dessa covardia que estão querendo fazer comigo e outros amigos funkeiros”, desabafou, antes de comparar o que acontece quando pessoas de outros contextos sociais retratam o que se passa em favelas.

“Vim da favela, eu não li e nem assisti a realidade nossa. Playboy interpretando o que acontece concorre ao Oscar e nós, daqui, sofremos essa covardia”, afirma.

O advogado Guilherme Pimentel, ouvidor-geral da Defensoria Pública do Rio de Janeiro interpreta as intimações e depoimentos na Polícia Civil do RJ como um combate à cultura da favela.

“Nitidamente é uma onda contra a cultura da favela, não está descolado da criminalização da favela, seletividade que tem sua herança escravocrata e colonial”, analisa Pimentel.

Segundo o advogado, a forma com que é usado o crime de apologia em investigações explicita uma repressão voltada às populações negras. Cita a criminalização da capoeira, do samba e do rap como exemplos para a “continuidade de um processo histórico” que atinge o movimento funk.

Ele cita outras ações da Polícia Civil do RJ contra funkeiros em 2010, como MC Galo, MC Smith e MC Frank. Eles também foram investigados por apologia ao crime organizado, parte deles foram presos.

Recentemente, o MC Poze foi preso por tráfico de drogas e associação, além de apologia. Outro funkeiro, DJ Mozai ficou 9 meses preso preventivamente em processo por associação ao tráfico. A Ponte denunciou o caso de Mozai em 19 de agosto.

À Ponte, o DJ comentou a intimação e depoimento dos MCs. “Essa perseguição aí vem com bastante artistas do funk. Renan da Penha, eu, MC Poze, DJ Yasmin Turbininha e, agora, os MCs Cabelinho e Maneirinho”, detalha.

Segundo ele, existe um medo de voltar a ser alvo pelo seu processo ainda estar aberto. “É bem provável de virem atrás de mim. Não fui condenado ou absolvido, então ainda há muito a acontecer”, afirma.

Guilherme Pimentel usa como exemplo o diretor do filme Tropa de Elite José Padilha. Elenca os crimes de assassinato e tortura cometidos pelo Capitão Nascimento, protagonista do filme, sucesso em todo país e no exterior.

“Jamais se cogitou prender o Padilha ou intimá-lo a responder por apologia cuja obra o personagem é um criminoso, agente do Estado”, diz. “Toda a política criminal, historicamente, foi construída para reprimir populações negras que, lá atrás, eram escravizadas”, emenda.

A Artigo 19, ONG que atua na garantia de liberdades de manifestação e expressão, analisa a intimação de Maneirinho e o depoimento de Cabelinho como uma “ruptura da liberdade”.

Diogo de Sant’Ana, advogado e coordenador do Centro de Referência Legal da Artigo, cita “preocupação” o fato da polícia levar à frente a queixa-crime do deputado Rodrigo Amorim.

“Não há detalhamento de onde vem a apologia nas músicas. Na verdade, a ideia de apologia ao trafico é usada não para fazer combate ao crime, é usada para combater a cultura de uma localidade”, analisa.

Nesta quinta-feira (29/10), a Ponte noticiou que investigações contra professores da AlfaCon, escola ligada ao Grupo Somos Educação e que ensina tortura e execução a futuros policiais, por “apologia ao crime não avançou”. Os professores Evandro Guedes e Norberto Florindo nem sequer foram convocados a prestar esclarecimentos às polícias Civil de São Paulo e Paraná, responsáveis pelas apurações.

A reportagem questionou ao advogado se era possível traçar um paralelo entre os dois casos, com os funkeiros sendo convocados a depor, enquanto os dois professores, ex-agentes públicos de segurança, não.

“O paralelo é ótimo. Não se investigou um caso real do crime de apologia”, pontua Sant’Ana, considerando que a comparação de Maneirinho sobre produções com foco na favela é feita por gente de fora das comunidades.

A Ponte questionou a Polícia Civil do RJ sobre a intimação de Maneirinho e o depoimento de Cabelinho. Em nota, a corporação se limitou a dizer que “instaurou procedimento para apurar eventual prática do crime de apologia ao crime, a partir de notícia crime apresentada pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj)”.

A reportagem tentou contato com o gabinete do deputado Rodrigo Amorim, mas ninguém atendeu os telefonemas. Também enviou e-mail com perguntas e pedido de entrevista e aguarda resposta.

Fonte: ponte.org

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