Agora é o STJ que exige banho quente para presos paulistas

Esse assunto começou em 2013 com essa reivindicação feita pela defensoria pública, agora chegou no STJ.

banho quenteSTJ exige banho quente em presídios do Estado de SP

Em decisão inédita e excepcional, 2ª Turma dá prazo de seis meses para mudanças
Livia Scocuglia
27 de Abril de 2017 - 16h41
"É fato notório que estamos diante de um desrespeitos maxificados dos direitos humanos", disse Benjamin, relator.Crédito Fotolia
O Estado de São Paulo tem seis meses para começar a fornecer água quente em unidades prisionais da capital. Em caso de descumprimento, a multa será de R$ 200 mil por dia. Inédita, a decisão é da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e foi proferida nesta quinta-feira (27/4) por unanimidade, depois de uma reviravolta no julgamento.
Além de citarem a dignidade da pessoa humana, os ministros criticaram a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que, em breve voto, havia negado o fornecimento de água quente nos presídios. A discussão do caso ainda está em sede de liminar.
“Eu proponho que a nossa decisão seja de reinstalar a decisão de primeiro grau [que, em liminar, havia decidido pela instalação de chuveiros e água quente nos presídios de São Paulo] e admitindo de pronto que o que não é adequado é fechar as olhos a uma violação gritante como essa de violação dos direitos humanos”, explicou o relator do caso, ministro Herman Benjamin.
A discussão do caso ganhou uma reviravolta na sessão desta quinta-feira (27/4). Isso porque, quando a turma começou a julgar o caso, no começo de março, o relator havia indicado que votaria pelo não conhecimento do recurso, o que extinguiria o processo sem chegar ao mérito da discussão.
No entanto, na data, o julgamento acabou sendo adiado porque o procurador do Estado de São Paulo não havia pedido para realizar a sustentação oral no prazo estipulado pelo STJ. A solução encontrada por Benjamin foi retirar de pauta o Resp 1.537.530, o que deu mais tempo para o ministro analisar o caso e alterar o seu entendimento original.
Segundo Benjamin, a decisão do TJ-SP, de relatoria do desembargador Ivan Sartori, tem apenas quatro parágrafos curtos analisando os fundamentos “fáticos” que levariam à concessão da segurança e “não tem uma palavra que seja sobre os direitos e interesses individuais e supra-individuais relacionando à dignidade da pessoa humana”, e complementou:
“Só isso já mostraria que nós não temos uma análise minimamente sólida dos argumentos associados aos direitos humanos e da dignidade da pessoa humana”, afirmou Benjamin.
Prova
Em seu voto inicial, o relator havia afirmado que para rever as conclusões do TJ-SP – que negou o pedido da Defensoria Pública – seria necessário rever as provas, o que é proibido pela Súmula 7 do STJ.
No entanto, ao trazer novo voto, o ministro citou o artigo 374 do novo Código de Processo Civil (CPC/15), que prevê que fatos notórios não dependem de prova.
“Todo mundo sabe que pelo menos durante quatro meses do ano temos temperatura abaixo de 20 graus e nenhum de nós tomaria um banho a 21 graus. Estou dando de barato que alguém tomaria um banho a 21 graus. É fato notório que estamos diante de um desrespeitos maxificados dos direitos humanos”, ressaltou Benjamin.
Por isso, o ministro explicou que não é o caso de abrir uma exceção para não aplicar a Súmula 7. Isso porque, na avaliação dele, a regra não se aplica porque o fato é notório e não depende de prova.
“Eu sou da época do Carandiru, do manicômio, fui o promotor responsável pelo manicômio judiciário. Eu conheço bem o que foi a situação carcerária no Estado de São Paulo”, disse Benjamin.
Votos
O ministro Mauro Campbell Marques afirmou que, neste caso, o certo é acompanhar o relator. “Um assunto desta natureza não pode ser tratado tão franciscanamente como foi tratada na decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo”, afirmou.
Do mesmo modo, a ministra Assusete Magalhães explicou que o Estado de São Paulo pode informar o Judiciário o que vai conseguir realizar no prazo de seis meses. “De maneira excepcional vou acompanhar o relator”, disse.
O ministro Francisco Falcão seguiu o mesmo entendimento e ressaltou: “É lamentável viver num país onde se pensa em construir estádio de futebol e o presidente do tribunal [TJ-SP] dá uma decisão de quatro linhas tolhendo o ser humano de tomar banho em condições normais, como o presidente do tribunal deve tomar”.
Argumentos
De um lado, o Estado de São Paulo apontou para a existência de perigo de lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, além de não haver condições técnicas de instalação de equipamentos de aquecimento porque as unidades prisionais não aguentariam o aumento de carga, ainda que implantados sistemas de aquecimento à gás ou solar.
Alegou ainda que a instalação dos equipamentos exigiria intervenção no estabelecimento prisional que não se faria sem o deslocamento dos detentos, o que seria complicado devido ao déficit de vagas no sistema penitenciário paulista.
Do outro lado, representando a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Rafael Muneratti, alegou que submeter os presos a tomarem banho frio, sobretudo no inverno, caracterizaria ato de crueldade.
De lá pra cá
O trâmite do processo é longo e começou em 2013 quando a Defensoria Pública ingressou com ação pedindo que o Estado de São Paulo fosse obrigado a instalar equipamentos para garantir o banho com temperatura adequada em todas as unidades prisionais do Estado.
No mesmo ano, a 12ª Vara de Fazenda Pública determinou o fornecimento de água quente aos presos em até seis meses, sob pena de multa diária de R$ 200 mil.
No entanto, a liminar foi suspensa pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Na ocasião, o relator do caso, desembargador Ivan Sartori, acolheu os argumentos do governo de que a ordem judicial representa ameaça de grave lesão de difícil reparação.

Fonte: JOTA

https://jota.info/justica/stj-exige-banho-quente-em-presidios-do-estado-de-sp-27042017