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Estado de SP aplica "pena de fome" em seus presídios, com média de jejum de 15 horas por dia; diz revista

 Padrão em cartas de presos, relatos de familiares e inspeções da Defensoria revela que a fome é política de Estado.

"Dona Maria, aqui também não está nada fácil. A maior dificuldade é a fome. Cortaram muitos itens, como o docinho, o pãozinho, a salada e o suco. A nossa alimentação não está nos suprindo. No café um pãozinho e dois dedos de café. No almoço uma boia muito rala, dois dedos de feijão. A mesma coisa na janta, que a gente paga às 16h30 da tarde. Passamos mais de 14 horas sem nada para comer. No domingo, é uma caneca de sopa e uma bisnaguinha para cada. Muitos passam mal de fome. Eu mesmo já passei mal."

A carta é de um homem preso no Centro de Detenção Provisória (CDP) de Pinheiros, em São Paulo, e chegou ao Brasil de Fato por meio da Associação de Amigos e Familiares de Presas/os (Amparar). O relato não é, nem de longe, isolado.  

Com 201.088 pessoas aprisionadas no momento, o estado de São Paulo, apesar de corresponder a aproximadamente um quinto dos habitantes do Brasil, concentra cerca de um quarto de toda a população carcerária do país (que somava, em junho de 2021, 820.689 pessoas de acordo com dados do Ministério da Justiça). 

Com mais de 202 mil pessoas atrás das grades, o estado paulista concentra um quarto
de toda a população carcerária do país - Brasil de Fato

Nos últimos 26 anos, São Paulo aumentou o encarceramento em 400% e, com ele, também seu complexo prisional. Representando cerca de um sétimo das 1.381 prisões espalhadas pelo país, o número de presídios no estado hoje está em 179. 

"Em praticamente todas as unidades que a gente visita, a falta de alimentação ou a insuficiência dela é uma pauta das pessoas que estão presas", alega Thiago de Luna Cury, coordenador do Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo.

Jejum de 15 horas por dia

Em afronta à Resolução 3/2017 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, que estabelece a obrigatoriedade do fornecimento de cinco refeições diárias, em quase todas as cadeias paulistas o acesso à comida acontece três vezes por dia.

Além disso, como narra a carta, a regra geral é a imposição de um jejum de, em média, 15 horas por dia. É o intervalo entre o jantar, servido aproximadamente às 16h30, e o café, às 7h30. 

Em junho de 2021, a Defensoria Pública de São Paulo apresentou uma Ação Civil Pública (ACP) contra o governo estadual na qual afirma que "foi instituída a 'pena de fome' aparentemente de forma deliberada pela unidade federativa mais rica desta República". 

A ação segue tramitando na justiça. No documento, dados obtidos a partir da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) e das inspeções dos defensores dentro das unidades apontam que, dentro de uma amostra de 130 presídios, em 80% deles o Estado fornece alimentação três vezes por dia. 

É menor que 4% a porcentagem de unidades prisionais que, com cinco refeições diárias,
respeitam a normativa federal / Brasil de Fato com dados da Defensoria Pública

Em 75,3% deles, a duração do jejum compulsório varia entre 13 e 16 horas diárias. Em quatro das cadeias, o período oscila entre 16 e 20 horas sem comer todos os dias. 

"Não é possível conceber que pessoas presas não tenham garantido o mínimo necessário a uma existência digna, o que, por óbvio, inclui a oferta de alimentação em quantidade e qualidade suficiente para garantia de sua saúde. Tratamento similar não se dispensa a animais de parques e zoológicos", discorre a Ação Civil Pública. 

Como explica a nutricionista clínica Talita Kumy, quando alguém passa muitas horas sem comer, o organismo se adapta por meio de hormônios para inibir a fome. "São os hormônios anorexígenos. Mas a necessidade energética continua. Aí o organismo começa a usar aquilo que ele tem de estoque: o tecido adiposo, a gordura, a massa magra, o tecido muscular", elenca. 

"A primeira refeição depois disso, nesse caso, normalmente é o pão. Ele tem um alto índice glicêmico, é como se desse um susto no pâncreas, que começa a liberar muita insulina de uma vez só", descreve Kumy, formada pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e com atuação voltada à segurança alimentar como direito humano. 

Considerando as Unidades que não deram informação, podem ser ainda mais numerosos
os presídios que impõem largos períodos sem comer / Brasil de Fato com dados da Defensoria Pública

Conforme expõe Talita, "esse processo causa muito desgaste no organismo. Pode gerar agressividade e indisposição e também outras consequências ao longo da vida, como desnutrição e diabete". 

Em nota, a SAP afirmou que "o intervalo entre a última refeição de um dia e a primeira do dia seguinte é menor que o relatado pela Defensoria". Qual seria, então, esse intervalo? Não foi informado. O Brasil de Fato fez seguidas solicitações - desde o dia 26 de janeiro - a respeito do horário das refeições no sistema prisional paulista e não teve a pergunta respondida. 

Segundo a SAP, o largo tempo entre o jantar e o café "é necessário por questões administrativas como contagem dos custodiados e troca de turno".

Prioridade orçamentária é expandir o sistema prisional

Com o mais recente presídio inaugurado no fim de 2021 em São Vicente, já são 17 cadeias a mais no complexo prisional de São Paulo só nos últimos oito anos. No que depender dos gestores, o ritmo deve continuar: mais cinco unidades estão em construção. 

A lógica é questionada pela ACP da Defensoria Pública, segundo a qual "investe-se em construir prisões sem qualquer planejamento no sentido de se haverá comida para as pessoas presas – sim, são pessoas como nós".

Comparando as Leis Orçamentárias Anuais (LOAs) do estado de São Paulo de 2021 e de 2022, a previsão de investimento em “provisão de necessidades básicas para a população carcerária”, que inclui alimentação, higiene e alojamento, aumentou 15,75%. Já o investimento em expansão de vagas e presídios saltou 345,21%. 

Em uma inspeção feita na Penitenciária 2 de Guareí em 2 de outubro de 2020, os depoimentos coletados por defensores sobre a alimentação – servida às 6h30, às 11h e às 16h30 – foram de "quantidade insuficiente", "qualidade mediana", "pouquíssima variedade" e "fruta ou salada fornecida apenas uma vez por semana".  

"Relataram também que a quantidade de leite servida no café da manhã é insuficiente e este às vezes é servido azedo. As informações colhidas ainda dão conta de que não haveria dieta específica para pessoas com diabetes ou outras doenças que necessitem de alimentação diferenciada", discorre o relatório da Defensoria Pública.

Penitenciária II de Guareí é citada no estudo em referência aos baixos investimentos em alimentação

R$ 4,50 por pessoa ao dia

Com um cálculo feito a partir do valor destinado para a alimentação repassado à Penitenciária 2 de Guareí em 2019 e 2020, dividido pela média de pessoas presas e agentes penitenciários, a Defensoria chegou ao resultado de que o investimento estatal em alimentação é de R$ 4,50 diários per capta. Isso equivale a menos de R$ 1,50 para cada refeição.

Segundo a Ação Civil Pública, "fica evidente que as pessoas presas na Penitenciária de Guareí 2 são submetidas à pena de fome, por conta de ilegalidade cometida pelo estado de São Paulo, que repassa valor insuficiente à unidade prisional para a aquisição de gêneros alimentícios".

No Centro de Progressão Penitenciária (CPP) de Franco da Rocha a situação é similar. Com o mesmo cálculo, de acordo com a Defensoria, o repasse para a unidade prover alimentação nos anos de 2019 e 2020 foi de menos de R$4,21 diários para cada pessoa.

Ao Brasil de Fato a SAP afirmou que "os valores informados pela Defensoria Pública estão defasados e não representam o valor per capta atual". Este, no entanto, não foi informado. 

De acordo com o órgão do governo estadual - sob gestão de João Doria (PSDB) -, no CPP de Franco da Rocha e na Penitenciária 2 de Guareí "a comida é preparada pelos próprios presos em uma cozinha própria da unidade, com alimentos que são adquiridos via pregão eletrônico, de acordo com a legislação".

A SAP informa, ainda, que "são adquiridos gêneros da agricultura familiar por meio do Programa Paulista da Agricultura de Interesse Social (PPAIS), sendo a primeira Secretaria de Estado a aderir ao programa". 

Ao lado direito, observa-se a quantidade de repolho definido como "salada" / Defensoria Pública de SP

A "mistura"

Oguntemi está com o filho preso há um ano e sete meses no CDP de Hortolândia. Lá, a capacidade é de 844 vagas, mas vivem 1.061 pessoas. 

"O que eu já vi e vivi lá dentro é um horror. Os presos evitam de comer a carne, por exemplo. Eu não sei o porquê, mas eles dizem que quem come carne tem muito furúnculo e que não conseguem atendimento médico", conta Oguntemi.

"Eu presenciei, eu vi, eu vi", faz questão de salientar, "um preso que tinha, pelo corpo, 16 furúnculos. Todos inflamados. Ele andava com os braços abertos e os olhos escorrendo lágrimas de dor", narra. 

Furúnculo é uma infecção bacteriana na pele e, segundo a nutricionista Talita Kumy, a recomendação nesses casos é de reduzir o teor de gordura da carne ingerida. 

"O que acontece é que a exposição ao açúcar dos ultraprocessados combinada com a baixa ingestão de frutas e verduras pode causar processos inflamatórios que baixam a imunidade e facilitam a contaminação da bactéria que causa o furúnculo", aponta. 

Na Penitenciária de Potim 2, segundo outro pedido de providências da Defensoria, o problema central é também o da chamada "mistura". 

Desta vez, foi feito um cálculo a partir de informações fornecidas pela unidade prisional, comparando, por um lado, a quantidade per capta de proteína de origem animal comprada. E, por outro, aquela que obrigatoriamente deveria ser oferecida de acordo com as normativas do próprio estado de São Paulo (Resolução SAMSP 16/1998). 

A conclusão é de que, em 2019, foi servido 69,3% da proteína animal necessária. No ano seguinte a situação piorou, passando para 67,9%. 

Fotos tiradas em anos diferentes mostram a quantidade de água no feijão de unidades do CDP
de Pinheiros / Defensoria Pública de SP

Feijão ralo e dois dedos de café

Além da "mistura", reclamações recorrentes atestam que o feijão é ralo e que faltam verduras, saladas, legumes e frutas. "Não tem tempero. É muita água para poder render", constata Oguntemi. 

É o que mostram fotos feitas ao longo dos últimos três anos em inspeções da Defensoria nas quatro unidades do Centro de Detenção Provisória de Pinheiros, na capital paulista. 

Na visita mais recente feita pelos defensores ao CDP 4 de Pinheiros, em 2021, "o relato dos presos foi unânime que há uma semana era servido apenas macarrão com salsicha ou linguiça durante o almoço e o jantar", aponta o relatório.

Depoimentos dos detentos criticam, ainda, a pequena quantidade de café e leite distribuída pela manhã e o fato de o pão ser menor que o comum. 

"Conversando com as mães aqui, na porta, a principal reclamação é a fome. E depois vem a doença, né? Sarna, picadas de insetos. Mas a fome é a principal", conta Oswaldo*, cujo irmão está detido no CDP de Pinheiros. 

Olhando para a marginal, que beira a cadeia, e apontando para um dos muros que o separam de seu parente, Oswaldo respira fundo e define: "Isso aí não fica atrás de um campo de concentração nazista". 

Café a manhã servido no CDP 4 de Pinheiros quando defensores públicos fizeram inspeção em 2021 / Defensoria Pública de SP

Escassez de frutas, legumes e verduras

De acordo com Oguntemi, a alimentação em Hortolândia é "reduzida". "São marmitex de tamanho médio, geralmente com a comida azeda. Eles passam muita fome. Muuuita fome. É muita escassez mesmo", relata.

A Resolução 3/2017, por meio da qual o Ministério da Justiça e Cidadania dispõe sobre a prestação de serviços de alimentação às pessoas privadas de liberdade e aos trabalhadores do sistema prisional, baseia-se no Guia Alimentar da População Brasileira. 

Por isso, determina que os cardápios dentro das prisões devem oferecer, "no mínimo, cinco porções de frutas, verduras e/ou legumes in natura por dia (400g/por dia)".

Nada parecido com isso foi observado nas inspeções da Defensoria Pública em qualquer uma das unidades prisionais do estado. 

De acordo com o órgão, no CPP de Franco da Rocha, por exemplo, nos anos de 2019 e 2020, foram adquiridas apenas 56,8% da quantidade de legumes e verduras que seria obrigatória. 

Em visita à Penitenciária 2 de Guareí, defensores observam a ausência de legumes, verduras]
 e saladas no almoço / Defensoria Pública de SP

Casos extremos de insuficiência nutricional

Lembrando das seis pessoas presas que morreram e das 56 que foram internadas no Piauí por falta de vitamina B1, Talita Kumy explicita que a falta de minerais e vitaminas decorrentes da ausência de frutas e verduras pode levar a casos extremos de insuficiência nutricional. 

"E, em menor grau, afetam o funcionamento adequado do organismo, causando uma liberação maior de cortisol, uma relação intestinal pior", descreve a nutricionista, ao concluir que os impactos daí decorrentes à saúde e ao humor são "o oposto de ressocialização". 

Questionada, a SAP diz "que em todas as unidades da Pasta são servidas, ao menos, três refeições (café, almoço e jantar) diariamente. A alimentação é balanceada e segue um cardápio previamente estabelecido e devidamente elaborado por nutricionistas".

Sacola com itens do jumbo, como comida caseira e alimentos processados e água  Foto: Aimee Louise/Coletivo 011

As famílias, o jumbo, os ultraprocessados e a fome oculta

A letra cursiva preta de outra carta de um preso do CDP de Pinheiros a que o Brasil de Fato teve acesso descreve desespero. "Peço que ligue para a mãe e pergunte se ela conseguiu tirar os documentos e se ela já enviou... Pelo amor de Deus, conto com sua ajuda". 

O detento se refere à larga lista de documentos autenticados em cartório exigidos pela SAP para que o familiar de alguém encarcerado faça uma carteirinha e possa, assim, lhe enviar um kit de mantimentos – o chamado jumbo. Com as restrições decorrentes da pandemia de covid-19, o trâmite só pode ser feito via correio. 

"Estou desesperado", discorre na carta, "já fazem sete meses que eu me encontro nessa situação. Só estou com a roupa do corpo.  Passando fome, frio e por muitas dificuldades". 

Em outra carta, um preso conta que já está encarcerado provisoriamente há um ano e que sua mãe conseguiu fazer a carteirinha apenas no sétimo mês. 

"Recebi um Sedex em que foram retidos alguns itens simples como escova dental, sabonetes, troca de roupa e um creme de pele. Expliquei que era meu primeiro Sedex e que necessitava de tais itens, mas não teve jeito", conta. 

"Ainda não tive nenhuma visita e também não tenho recebido cartas da minha família". E continua: "Não sei se estão passando por dificuldades. Gostaria muito de dar um abraço na minha mãe e conversar com ela". 

Em uma das duas barracas de comida que ficam ao lado da entrada do Complexo de Pinheiros,
vendem-se bolos, pudim, água e refrigerante. O local funciona também como guarda-volumes:
as visitantes podem deixar a bolsa por R$4 e o carrinho de feira por R$ 5. O aluguel de uma peça
de roupa na cor exigida pelo regulamento sai por R$ 6 - Crédito: Marcos Vilas Boas

Na opinião de Oguntemi, a saúde de seu filho depende do jumbo que ela envia. "Do meu filho e de todo preso. É a família que precisa manter o filho lá com a saúde alimentar dentro do aceitável. Do minimamente aceitável para um ser humano", afirma Oguntemi.

Os alimentos permitidos no jumbo, no entanto, são quase 100% de produtos industrializados ultraprocessados. 

Para se ter uma ideia, os itens alimentícios que podem ser enviados para a Penitenciária de Pracinha são: 500g de leite em pó, 400g de bolacha sem recheio, dois bolos Pullman, 300g de chocolate, 300g de bala Halls, Freegells ou Soft, 250g de manteiga ou margarina, um pacote de pão Pullman e 500g de frios. 

A variação entre o que é permitido no jumbo é mínima entre as unidades prisionais de São Paulo. 

"O alimento ultraprocessado atua como um composto anti-nutricional", alerta Talita Kumy. "Então você come o bolo ultraprocessado, ele atua retirando nutrientes do seu corpo", diz. Essa carência não explícita de micronutrientes no corpo se chama "fome oculta". 

Na sacola do visitante: Macarrão à bolonhesa,brócolis cozido, frango ao molho de tomate,
bolo “industrializado” de baunilha e 1 garrafa de refrigerante fanta

Alimento como arma de guerra

"Total indignidade". É assim que Oswaldo caracteriza a vida atrás das grades. Revoltado com as condições descritas em cartas por seu irmão aprisionado, ele salienta que "convenções de guerra dão tratamentos melhores aos prisioneiros do que os dados aos nossos presos aqui". 

Comparação similar é feita pela Ação Civil Pública da Defensoria ao citar a 3ª Convenção de Genebra Relativa ao Tratamento dos Prisioneiros de Guerra (1949), também ratificada pelo Brasil. 

Nela, é determinado que "a ração alimentar diária básica será suficiente, em quantidade, qualidade e variedade, para manter os prisioneiros de boa saúde e impedir uma perda de peso ou o desenvolvimento de doenças por carência de alimentação".

No jumbo da visita: Frango assado, arroz temperado, bolo de laranja "industrializado",
queijo ralado, pão de forma "industrializado" e 1 garrrafa de refrigerante de Coca-cola

Sobreviventes

Railda Alves, uma das fundadoras da Amparar, ressalta que "a regra é que as pessoas voltem do sistema prisional extremamente magras e doentes". Não à toa, movimentos abolicionistas se referem a elas como sobreviventes. 

Doutor em Ciências pela Faculdade de Saúde Pública da USP, membro do Grupo de Pesquisa Democracia, Saúde e Ambiente (DEMSA/UFU) e integrante do grupo Alimentação e Poder, André Luzzi avalia que, na gestão do sistema prisional, "a alimentação é vista como um insumo, uma mercadoria, um serviço contratado, e não como um direito".

Além de transformar a realidade do que acontece do lado de dentro das grades, Luzzi defende que ações a esse respeito sejam pensadas também para os libertos. "Como será possível construir espaços de reparação para essas violações do direito humano à alimentação?", questiona.

"Aí você tem a má alimentação, doenças que vêm devido à falta de nutrição, não tem socorro. Então o que acontece? Dentro dos presídios do Brasil, a exemplo do estado de São Paulo, é tortura física e psicológica. É a desumanização da pessoa", resume Oguntemi. 

Em sua visão, se alguém espera que uma pessoa "cometa um crime, vá para o sistema carcerário e venha melhor para a sociedade, isso não vai acontecer. Não vai". 

"Se ele não sabia o que é tortura, o que é crueldade humana, ele vai aprender lá dentro. Vai saber o que é ficar com fome, o que é ficar com sede por dias", cita. 

Na Ação Civil Pública, a imposição da "pena de fome" no sistema prisional paulista é caracterizada como "uso do alimento como arma de guerra". O que leva a crer, nas palavras da Defensoria Pública, na "presença de uma guerra civil / estado de exceção em permanência na política adotada pelo estado de São Paulo".

Fonte: https://leandroleandro2018.blogspot.com

Beijo sem máscara em presídio leva casal a ser denunciado pelo Ministério Público

Beijo sem máscara em presídio leva casal a ser denunciado pelo Ministério Público Na ocasião, uma mulher visitava o companheiro com quem tem união estável e que se encontra custodiado

O Ministério Público de São Paulo ofereceu denúncia contra um casal que tirou a máscara de proteção contra a Covid e se beijou em um presídio do interior paulista, durante o período de visitas.

O caso, que ocorreu em um centro de detenção provisória da cidade de Pacaembu (SP), já teve um pedido de arquivamento negado.

Na ocasião, uma mulher visitava o companheiro com quem tem união estável e que se encontra custodiado. De acordo com relatos, os dois teriam se abraçado, abaixado as máscaras e se beijado, contrariando normas para evitar o contágio pela Covid.

Beijo sem máscara em presídio leva casal a ser denunciado pelo Ministério Públicohttps://www.bandab.com.br/wp-content/uploads/2021/10/prisao-300x200.jpg.webp 300w" data-sizes="auto" data-src-webp="https://www.bandab.com.br/wp-content/uploads/2021/10/prisao.jpg.webp" data-srcset-webp="https://www.bandab.com.br/wp-content/uploads/2021/10/prisao.jpg.webp 768w, https://www.bandab.com.br/wp-content/uploads/2021/10/prisao-300x200.jpg.webp 300w" width="768" height="512">Foto: Defensoria Pública/Divulgação

Por causa do gesto de afeto, o casal foi indiciado por supostamente infringir determinação do poder público destinada a impedir a propagação de doença contagiosa. A pena prevista para o crime é de um mês a um ano de detenção, além de multa.

A Defensoria Pública de São Paulo, agora, recorre com um habeas corpus junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo. O órgão pleiteia a concessão de liminar determinando o arquivamento do processo.

“Qual a relevância penal de um abraço e um beijo de um casal dentro de um estabelecimento prisional, local onde as péssimas condições sanitárias são amplamente propaladas desde muito antes do cenário de pandemia atualmente vivenciado?”, questiona o defensor público Paulo Eduardo Pereira Rodrigues.

“Necessário lembrar também que desde o início da pandemia causada pela Covid-19, diuturnamente se vê nos noticiários o presidente da República e outras autoridades dos mais altos escalões dos três Poderes descumprindo normas de segurança sanitária e em momento algum foi noticiada a profusão de procedimentos penais como ferramenta para coibir tais condutas”, afirma ainda.

À mulher acusada de propagação de doença contagiosa foi proposto o pagamento de multa de um salário mínimo. O possível acordo será discutido em audiência prevista para o dia 9 de março. Seu companheiro, por sua vez, ainda aguarda o recebimento da denúncia.

Fonte: https://www.bandab.com.br/

Presos denunciam falhas em tornozeleiras e medo de 'perder' regime semiaberto

 Famílias relataram problemas com bateria e “apitadas” do aparelho mesmo quando estavam dentro de casa e no horário marcado durante saída temporária de Natal em SP; presos ficaram de “castigo” em cela isolada após falha das tornozeleiras

― Boa noite, seu Franco, a situação é a seguinte, minha matrícula é ******, eu tô com a tornozeleira eletrônica. Eu tô tentando carregar ela, ela mostra que tá carregando, só que mesmo assim tá pedindo carga, tanto no carregador portátil quanto ligada direto [na tomada]. Estou filmando, estou mostrando que ela está carregando, mas queria ver se o senhor consegue dar uma olhada no sistema e ver se está tudo certo, se está tudo ok.

― Aqui no sistema está como normal.

― Nossa, mas se ela não passar carga, o que eu faço? E se ela [tornozeleira] apagar?

― É… Você vê se de repente é algum mau contato, alguma coisa no carregamento. Mas, realmente, vai filmando para ter prova aí qualquer coisa. Aqui no sistema não está constando nada.

― Tá normal, seu Franco?

― Aqui tá normal.

― Então, porque eu tô tentando carregar ela [tornozeleira], ela vibra, tá mostrando que tá carregando, aí ela vibra, dá aquela vibrada e os toques, aqueles apitos. Eu tô carregando ela como eu fui orientado pelo seu Rogério, ele que instalou a tornozeleira, e falou [que] o [carregador] portátil é só um quebra-galho, foi as palavras que ele usou, certo? E é para carregar no fio [da tomada]. Eu tô carregando no fio todos os dias. Até hoje, não deu problema nenhum, só que agora ela tá apitando e pedindo carga mesmo carregando e eu não sei o que é, se é algum defeito que tá acontecendo.

― Entendi… Acho que é mau contato, alguma coisa do tipo.

― Eu já olhei, seu Franco. Troquei de tomada, coloquei o [carregador] portátil, coloquei o cabo, e mesmo assim ela continua [descarregando]…

― Depois dá um retorno para mim.

― Tá bom, seu Franco, se continuar apitando, eu vou ligar. Deus abençoe.

― Amém. Boa noite.

Essa foi uma das gravações em vídeo que Felipe* fez no dia 27 de dezembro de 2021. Reeducando do regime semiaberto, tinha deixado a Penitenciária Odon Ramos Maranhão, localizada na cidade de Iperó, no interior paulista, para passar o Natal e o Ano Novo com a família por conta do direito à saída temporária, a chamada “saidinha”. Segundo a mãe, o rapaz tinha saído com a namorada e retornado para casa por volta das 18h40, já que entre as 19h e 6h ele não poderia deixar o local e nem circular para além de um perímetro estipulado. “Dentro de casa, a tornozeleira começou a apitar do nada”, conta.

Felipe gravou a programação da TV, que aparecia às 19h50 a exibição do telejornal SBT Brasil, registrou os pais, a namorada e os cômodos da casa, mostrando que estava na residência da família no período noturno na capital paulista. Registrou ligação à Polícia Militar, cujo atendente orientou que ele ligasse para a unidade prisional e fizesse um boletim de ocorrência, assim como também teve a mesma orientação da Polícia Civil. Filmou as tentativas de ligação à penitenciária até conseguir ser atendido. Nesse meio tempo, entre um vídeo e outro que a Ponte acessou, a tornozeleira apitou. Ele também registrou um boletim de ocorrência eletrônico. Segundo as trocas de mensagens dele com o advogado, a tornozeleira só parou de dar problema na manhã do dia 28 de dezembro, quando depois das 6h30 havia saído de casa.

Quando a família o levou de volta para Iperó, no dia 3 de janeiro, a mãe disse o equipamento também apitou já na porta da penitenciária. “Não quiseram nem saber, verificar nada, já mandaram ele direito para o castigo”, afirma a mãe. Castigo é uma espécie de cela solitária. A direção da unidade descreveu que o sistema de monitoramento identificou que Felipe cometeu violação por ter estado fora de casa no dia 25 de dezembro, das 4h46 até 5h44, e em 27 de dezembro, das 19h às 6h. A mãe aponta que o filho estava nos dois horários dentro da residência e tentou solicitar imagens do circuito do condomínio para atestar a veracidade, mas a síndica do prédio, conforme troca de e-mail com advogado, apenas forneceria mediante decisão judicial. O pedido foi feito ao Tribunal de Justiça, que ainda não se manifestou.

O documento da Spacecom Monitoramento S/A, empresa contratada para o fornecimento dos equipamentos, apontou que Felipe havia percorrido 2.251 metros, saindo de um ponto na Avenida Angélica e dando uma volta na região central da cidade até retornar ao mesmo local. A empresa é uma das maiores fabricantes no país e já teve contratos anteriores com a administração paulista, e voltou a ser contratada em 2018 para monitorar 7 mil presos do regime semiaberto em situação de trabalho externo e em saídas temporárias ao custo de R$ 28,3 milhões, depois de o governo romper o contrato com a Synergye Tecnologia da Informação, em 2017, por uma série de problemas por mau funcionamento.

Trechos dos vídeos gravados por Felipe* em ligação para a unidade prisional às 19h51 de 27/12/2021. Censuramos o braço do reeducando para evitar identificação por meio de tatuagens | Fotos: reprodução/arquivo pessoal

“Meu filho ficou 21 dias na cela com a mesma roupa”, denuncia a mãe. Com Felipe, também estavam Gabriel* e Marcio* na cela, cujas esposas relataram problemas nas tornozeleiras da empresa Spacecom e no mesmo período da saidinha de Natal. “Faltavam dois meses para ele ir para o regime aberto, ele não ia cometer uma falta para perder essa oportunidade que ele lutou tanto”, lamenta a mãe de Felipe.

Segundo o advogado Helder Gustavo Cardoso Pedro Bello, os presos estavam em situação degradante na cela. “Eu consegui contar umas oito pessoas, eles relataram que chegaram a ficar em 30, sem camas, apenas um buraco no chão para necessidades fisiológicas e sem janela, sem banho de sol, uma violação de direitos dos presos”, relatou à Ponte. “Fiz denúncia à Coordenadoria de Unidades Prisionais da Região Central do Estado, Corregedoria da SAP (Secretaria da Administração Penitenciária), Ministério Público, mas ninguém me deu retorno, pelo contrário, a direção da unidade disse que eu estava atrapalhando o serviço público”.

O diretor da Penitenciária de Iperó Heber Anor Janei argumentou que o defensor teria o objetivo de “arrobustar uma defesa técnica em favor a seu cliente, contudo pautamos não haver necessidade de tal depreciação e taxação negativa ao serviço público prestado por este estabelecimento conforme peticionado, atitude que tão somente desestabiliza e minorar as rotinas penitenciárias, visto o facilitado acesso dispensado por este gestor e sua equipe no atendimento aos pleitos diários pleiteados aos causídicos [advogados]”.

Todos os três presos, de acordo com as famílias, seguiram as orientações do termo de compromisso da SAP que assinaram sobre como proceder quando acontecesse algum incidente.

Reprodução do termo de compromisso da SAP assinado pelos reeducandos para uso da tornozeleira eletrônica

Janei foi quem solicitou à Vara de Execuções Penais a suspensão cautelar do regime semiaberto de Felipe, Gabriel e Marcio enquanto seriam apuradas as supostas violações do monitoramento eletrônico. Ele alegou “tentativa de fuga do averiguado”, embora os três tenham retornado à penitenciária conforme a data prevista. Os pedidos foram acatados pelo juiz Emerson Tadeu Pires de Camargo, em janeiro, sem nem ao menos o procedimento de apuração disciplinar ter sido concluído e remetido para avaliação.

Para a professora de Direito Penal da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) Maíra Zapater, a suspensão antecipada do regime pode ser considerada “arbitrária e ilegal”. “Essa decisão não cumpre com a Lei de Execução Penal, a regressão depende da comprovação da violação e, uma vez comprovada a violação, ouvir o Ministério Público e a defesa e aí se manifesta. Não tem uma previsão cautelar ou provisória”, analisa. “Então, você impor um castigo porque teve um problema com a tornozeleira em que não dá para saber se a tornozeleira falhou ou se a pessoa fez o mau uso é arbitrário e, ao meu ver, é ilegal”.

“Por causa de 4 minutos, fuderam com a minha vida”

Márcio* também foi para a casa da família em São Paulo passar as festas de final de ano. Por volta das 20h do dia 30 de dezembro, porém, apontou que as luzes verde, azul e vermelha do aparelho começaram a piscar, a tornozeleira vibrava e apitava. Tanto ele quanto a esposa ligaram para a unidade prisional, em que um funcionário chamado Fernando teria dito que o reeducando estava fora do perímetro estipulado. Márcio gravou um vídeo mostrando que estava dentro do apartamento, gravou a programação da TV, em que era exibida a novela Quanto Mais Vida, Melhor, da TV Globo, e as luzes piscando no equipamento. “Ele conseguiu chamar uma viatura da polícia porque mesmo falando com o seu Fernando, a tornozeleira não parava de apitar”, disse a esposa à reportagem.

Dois policiais militares foram ao prédio, por volta das 20h26, e fizeram o registro. O problema, no entanto, prosseguiu, mas desta vez com o carregamento da tornozeleira. Marcio gravou um vídeo, na manhã do dia 1 de janeiro, contando que toda a vez que carregava o equipamento, ao tirar da tomada, apitava com a indicação de que estava sem carga. Nas imagens, ele aparece com o fio conectado na tornozeleira e na tomada, sentado em um sofá. “Deixei carregando duas horas, quando eu tirei [o cabo], apitou”, diz. “Liguei na unidade e disseram que estava como 0% e que era para deixar na tomada. Se desligar, já era”.

Em outro vídeo, em contato por telefone, um funcionário que se identifica como Carlos de fato diz que no sistema consta como 0% de carga e que ou Marcio retornava para a unidade ou deixava o equipamento ligado na tomada. Mas, por ser 1 de janeiro, Márcio diz que não teria como retornar de São Paulo para Iperó de ônibus em cima da hora. O funcionário diz “eu avisei para vocês não saírem” e o reeducando responde que foi difícil conseguir o benefício. Já no dia 3 de janeiro, antes de retornar para a penitenciária, ele liga de novo preocupado sobre a tornozeleira e pede para que seja documentado problema, já que estava com receio de o carregador portátil não conseguir manter o aparelho ligado durante o percurso. “Eu tô há três dias com esse problema, plugado na tomada, sem sair do sofá”, relata na gravação. O funcionário disse que não tinha jeito e que Marcio deveria conversar com “seu Salvador”.

Ao retornar para Iperó, porém, acabou na cela de “castigo”, segundo a esposa. Na carta que Marcio lhe enviou, que data de 21 de janeiro, ele descreve que estava sozinho porque os outros 34 presos que estavam com ele tinham sido transferidos. E que passou 20 dias “trancado num quarto escuro, fedido, úmido, largado”, temendo retornar para a unidade do município de Lucélia porque lá não teria trabalho. “Aí eu tô tomando todos cuidados possíveis, quando eu chego aqui eles me falam que a tornozeleira apagou por 4 minutos, pô, é brincadeira, os caras me põe (sic) um equipamento e por causa de 4 minutos fuderam com a minha vida?”, questiona na carta.

Trecho da carta de Márcio* à esposa datada de 21 de janeiro de 2022 | Foto: Reprodução/ Arquivo pessoal

O ofício em que o diretor Heber Anor Janei pede a suspensão cautelar do regime semiaberto consta que a violação cometida teria ocorrido no dia 29 de dezembro e que a tornozeleira descarregou, mas não consta o horário nem a indicação de onde teria passado. A esposa de Marcio, no entanto, aponta que o problema aconteceu no dia 30. Nesse caso, o processo de Márcio não continha anexado documento da Spacecom sobre a situação da tornozeleira.

Gabriel* também fez registros em vídeo na noite do dia 29 de dezembro. A esposa conta que eles haviam saído para passear à tarde e retornaram para casa às 15h40. “Quando deu 19h, a pulseira [tornozeleira] começou a apitar”, declarou a mulher. Ele também registrou a programação televisiva, na qual era transmitida a segunda edição do SPTV, telejornal da Rede Globo, às 19h22.

“A gente ligou na unidade e o funcionário disse que se as luzes estivessem verde e azul, estava tudo bem, mas ele nem perguntou número de matrícula, nome nem nada”, diz a esposa de Gabriel. “A gente tentou acionar a viatura da polícia, mas não enviaram, então a gente fez o boletim de ocorrência e gravamos tudo”. Assim como nos casos dos outros dois, ao retornar para a penitenciária também foi para a cela de castigo.

O documento da Spacecom indica que Gabriel teria percorrido 140 metros para fora do perímetro estipulado entre 19h05 e 20h47 daquele dia. “Mas não faz sentido porque onde indica que quebrou o perímetro foi onde passamos durante à tarde”, contesta a mulher. “Eles já estão pagando pelo o que fizeram, e quando consegue o benefício acontece isso, não é justo”.

Os três casos são tratados pela direção da unidade como falta grave, que, se comprovada, pode estabelecer um ano de punição e fazer com que o preso regrida de regime, ou seja, perde o semiaberto e volte para o fechado. Na terça-feira (15/2), o diretor da penitenciária de Iperó representou pela aplicação de falta grave a Felipe. O juiz Emerson Tadeu ainda não decidiu se segue o entendimento do diretor ou não.

Controle penal

As situações denunciadas pelos três familiares de presos do regime semiaberto são semelhantes aos que o sociólogo e pesquisador da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e do NEV-USP (Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo) Ricardo Campello teve contato em 2017. Ele é autor do livro Curto-circuito: monitoramento eletrônico e tecnopunição no Brasil, que investiga do uso de tecnologias e dispositivos de monitoramento eletrônico de presos e presas no Brasil, dentre elas o uso de tornozeleiras eletrônicas em presos do regime semiaberto.

Um dos principais problemas que ele aponta é a falta de uma padronização normativa em casos de possíveis falhas ou incidentes nas tornozeleiras eletrônicas. “O sistema penitenciário não funciona como um sistema, mas como uma política fragmentada com um poder discricionário excessivo dos operadores da ponta”, destaca Campello. “No monitoramento eletrônico propriamente dito, a gente tem uma questão em que os próprios juízes não entendem muito bem como o sistema funciona para entender se aquela violação foi gerada por uma falha do equipamento, de uma falha de cobertura de sinal ou não, e isso fica ao critério dos supervisores da ponta, dos agentes penitenciários, que vão fazer essa comunicação aos juízes”, analisa.

Em agosto do ano passado, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) publicou a resolução 412 em que estabelece diretrizes para a aplicação e acompanhamento de monitoramento eletrônico, que não tem efeito de lei, mas de recomendação. No ponto 4, que trata de incidentes, estão descritas ações que o Centro de Monitoramento Eletrônico deve realizar caso identifique alguma violação ou anormalidade, com o objetivo de atuar de forma “gradativa”, com o mínimo de intervenção penal possível.

Por exemplo, se for identificada nível baixo ou descarga completa de bateria, além de registrar o incidente, o próprio operador tenta contato com a pessoa e seus familiares sobre a necessidade da recarga. Caso o problema persista em 48h seguidas, o juízo competente é avisado tanto do incidente quanto das tentativas de resolução, e se a pessoa comparecer à central, o equipamento vai ser inspecionado para verificar a presença de falha ou não para ajustar o cumprimento da medida. O CNJ também publicou, em 2020, um modelo de Gestão para Monitoração Eletrônica de Pessoas.

Em novembro do ano passado, o governador João Doria (PSDB) assinou decreto que cria, dentro do Departamento de Inteligência e Segurança da Administração Penitenciária, o Centro de Controle e Operações Penitenciárias, que trata da administração, execução e controle da monitoração eletrônica de pessoas presas. Porém, também não há diretrizes sobre casos de possíveis falhas.

Apesar de o monitoramento eletrônico não ser obrigatório para o cumprimento da saída temporária, a inclusão do equipamento inverteu a finalidade para qual passou a ser incorporada, avalia o pesquisador. “É uma política sustentada pela modernização do sistema penal, mas é carregada das precariedades do sistema penal brasileiro e não tem nada de ressocializador porque está, na verdade, controlando o pessoal que já iria sair na saidinha sem nada, só com base na confiança da sociedade, que é base do sistema progressivo de sair do fechado para o aberto e retornar para a sociedade, então acaba tornando o regime semiaberto em um regime um pouco mais fechado sem nenhum propósito desencarcerador”, critica. “Precisa de acompanhamento, equipe multidisciplinar, psicólogo, assistente social. Não é só entregar um equipamento que rastreia o cara e, se dá ‘pau’, ele vai para o castigo”.

A professora da Unifesp Maíra Zapater concorda. “Eu entendo que a pessoa que está sendo monitorada não pode arcar com falhas da tornozeleira que não são atribuíveis à ela. Você não pode impor esse ônus que teria que ser do Estado e que caberia ao Estado determinar quais são as regras de como a pessoa se conduzir”.

O que diz a SAP

Questionamos a Secretaria de Administração Penitenciária sobre as denúncias bem como questionamos sobre protocolos de atuação, monitoramento e manutenção dos aparelhos. A assessoria da pasta encaminhou a seguinte nota:

A Secretaria da Administração Penitenciária informa que, durante a saída temporária do período de Natal e Ano Novo, as tornozeleiras de três presos da Penitenciária de Iperó apontaram irregularidades. Um dos equipamentos indicou quebra do monitoramento por fim de bateria e, posteriormente, por quebra de área de inclusão – que se refere ao recolhimento no horário noturno em local de residência informado. Os outros dois apontaram também a quebra de área de inclusão.

A unidade abriu procedimento apuratório preliminar para averiguação dos fatos e comunicou o juiz responsável para sustação cautelar do benefício. Diante dos relatos dos presos, a direção da penitenciária solicitou à empresa Spacecom Monitoramento S/A a apresentação de laudos dos registros para investigação e comunicou o fato à Corregedoria da SAP.

É descabida a informação de sorteio, sendo que os critérios para a indicação dos presos que farão uso da tornozeleira são objetivos como grau de periculosidade.  Além disso, a colocação da tornozeleira é feita pelo presídio um dia antes da saída dos presos, a fim de identificar qualquer ocorrência de erro que possa ter no equipamento. Também são realizadas palestras com orientações aos presos sobre o uso da tornozeleira no período da saída temporária.

O que diz o Tribunal de Justiça

Perguntamos por que o juiz Emerson Tadeu determinou a suspensão cautelar do regime semiaberto dos casos mencionados, se ele tinha conhecimento sobre como o equipamento funciona e se realiza inspeções na unidade prisional. A assessoria do Tribunal de Justiça de São Paulo respondeu que “os magistrados não podem se manifestar fora dos autos, por vedação da Lei Orgânica da Magistratura”.

“Os juízes têm independência funcional para decidir de acordo com os documentos dos processos e seu livre convencimento. Essa independência é uma garantia do próprio Estado de Direito. Quando há discordância da decisão, cabe às partes a interposição dos recursos cabíveis, previstos na legislação vigente”, diz a nota. 

O que diz a Spacecom

Procuramos a Spacecom pelo site oficial, mas o contato de assessoria é de uma empresa que não presta mais serviços de comunicação, conforme ligamos. Telefonamos diretamente para o contato da sede em Curitiba (PR) cujo atendente que se identificou como diretor disse que a empresa estava sem assessoria. Ele disse que a Spacecom monitora mais de 50 mil presos no país e que não existem falhas nos equipamentos, não permitindo que déssemos detalhes sobre o caso. O diretor disse que caberia à secretaria responder aos questionamentos.

O que diz o Tribunal de Contas do Estado

Como o TCE-SP foi responsável por fiscalizar os equipamentos em 2018, quando da assinatura do contrato (que foi prorrogado até 2023 ao ser aditado em 2020), procuramos a assessoria para saber se houve algum tipo de apuração após o período.

O órgão disse que “com relação aos aparelhos relacionados, utilizados pelos reeducandos do regime semiaberto da Penitenciária Odon Ramos Maranhão, localizada na cidade de Iperó (SP) que tiveram a saída temporária no Natal de 2021, não consta ocorrência no processo TC-14982/989/18”. Porém, “houve apontamentos no acompanhamento da execução contratual em relação a problemas com a falta de sinal na região para as tornozeleiras (Coordenadoria da Região Oeste), sendo resolvidos após diversos testes e ajustes necessários, conforme consignado no acompanhamento realizado pela Fiscalização.” A unidade em Iperó integra a coordenadoria da região Central.

Ajude a Ponte!

“Em razão da pandemia do Coronavírus e como forma de prevenção, houve a suspensão temporária de trabalho externo, assim como de saídas externas, permanecendo somente o monitoramento eletrônico em situações excepcionais de medidas cautelares por decisão judicial. Assim, o valor do serviço prestado a partir de abril/2020 teve uma redução significativa”, diz a nota. Declarou que a Spacecom entrou com representação para que a SAP a indenize por conta de “inexecução parcial” do contrato.

O que diz a polícia

Questionamos se houve alguma apuração sobre os boletins de ocorrência registrados pelos três reeducandos. A In Press, assessoria terceirizada da Secretaria da Segurança Pública, informou que “os registros citados foram feitos pelos internos como não criminal”.

*Os nomes foram trocados a pedido das famílias que temem represálias.

Fonte: https://ponte.org

Facção que custeou acampamento no Palácio Iguaçu é denunciada à Justiça

 https://static.ricmais.com.br/uploads/2022/02/palacio-iguacu.jpg O Ministério Público do Paraná (MPPR) denunciou 29 pessoas investigadas na Operação Alcântara que, além de cometer crimes como homicídios e lavagem de dinheiro, teria custeado um acampamento na frente do Palácio Iguaçu, por vários dias, em fevereiro do ano passado. O acampamento era para protestar por melhores condições aos presos do sistema penitenciário no Paraná.

Conforme o MPPR, a facção criminosa em Paranaguá articulava a prática de crimes em diversas regiões do estado, mas tendo como foco a região litorânea. As investigações do MPPR, que contaram com o auxílio da Polícia Militar e do Departamento Penitenciário do Estado do Paraná, identificaram os principais líderes do grupo, em Paranaguá e outras cidades litorâneas, de onde enviavam ordens para os demais participantes da organização criminosa, presos e em liberdade, para o cometimento de diversos crimes.

Apurou-se ainda a existência de um esquema de recebimento e lavagem de dinheiro, mediante depósitos em contas bancárias de diversas pessoas ligadas ao grupo.

Manifestações

As investigações identificaram ainda que a organização criminosa teria fornecido auxílio financeiro para as manifestações pela melhoria das condições dos estabelecimentos prisionais e das regras para visitas aos presos, ocorridas em diversas regiões do Estado no início de 2021. O grupo teria financiado transporte e alimentação dos participantes.

Um dos atos ocorreu em Curitiba, diante do Palácio Iguaçu, no final de fevereiro do ano passado, com ampla divulgação na mídia – os manifestantes montaram um acampamento no qual permaneceram por vários dias em negociações com o governo, com diversas despesas custeadas pelo grupo criminoso, como a compra de tendas e a locação de dois banheiros químicos.

Líderes da organização teriam mantido contato diário com integrantes que estavam no acampamento, sendo atualizados sobre gastos, número de participantes e andamento das negociações com o governo estadual. O acampamento teria sido gerenciado segundo as regras do grupo criminoso.

Fonte: https://ricmais.com.br

Deppen forma 60 mulheres em cursos de capacitação e inaugura centro médico para os servidores

Centro de Integração Social de Piraquara forma 60 mulheres em cursos profissionalizantes e inaugura centro médico para os servidores A Polícia Penal do Paraná formou 60 mulheres do Centro de Integração Social de Piraquara em cursos profissionalizantes de diversas áreas na modalidade à distância neste sábado (22). A ação é uma parceria da Secretaria de Segurança Pública com a Igreja Universal e com as instituições de ensino superior Fan e a Fanduca.

Além disso, foi inaugurado o Centro de Atendimento Médico ao Servidor Lourival de Souza, para prestar serviços gratuitos de clínica geral e odontologia a todos os profissionais que trabalham no Complexo de Piraquara. 

O secretário da Segurança Pública, Romulo Marinho Soares, destacou que o apoio do governador Carlos Massa Ratinho Junior tem sido importante para mudar a imagem do sistema prisional do Estado. A transferência da gestão das carceragens da Polícia Civil ao Departamento de Polícia Penal, a conclusão de novas cadeias no interior do Estado, e a evolução com a criação da Polícia Penal são as conquistas mais marcantes da instituição nos últimos três anos.

"Estamos dando mais um passo importante na valorização dos profissionais que trabalham na condução dos presos e estamos demonstrando carinho e respeito com essa instituição", disse.

FORMATURA – Por meio da parceria da Secretaria com o grupo Universal nos Presídios e a Faculdade Fanduca, as mulheres privadas de liberdade tiveram acesso a cursos de capacitação profissional como cabeleireiro, empreendedorismo, gestão de empresas, etiqueta social, entre outras. As aulas ocorreram dentro do próprio CIS, em salas de aula adequadas para os estudos. Em outras regiões do estado formaturas também aconteceram.

Neste sábado, elas trocaram os afazeres internos da unidade pela maquiagem, preparação para a cerimônia. Com direito ao tradicional traje de colação de grau, elas receberam o canudo das mãos das autoridades do Departamento de Polícia Penal e da Igreja Universal.

O momento de maior reflexão da formatura foi com a canção "Carta de um Presidiário", entoada por todas as formandas. Muitas se emocionaram com as estrofes que abordam a saudade de casa, a convivência com a família e os momentos de lazer que ficaram na lembrança, mas se confortaram com a expectativa de uma vida normal fora dos portões da unidade, agora com mais chances de progredirem no mercado com os cursos.

"A educação está revolucionando o sistema prisional. Essa é uma ferramenta que tem que existir dentro do sistema prisional porque as pessoas entram aqui para cumprir as suas penas, mas elas precisam voltar à sociedade melhor do que entraram, para que possam ter uma nova perspectiva de vida", afirmou o secretário.

"São pessoas que ao sair daqui terão uma profissão para no mercado de trabalho competir de igual para igual, para ter seus recursos próprios financeiras de forma correta e serão cidadãs aceitas pela sociedade por motivo de uma mudança", disse o professor Adriano Valotto, da Fanduca.

CENTRO MÉDICO – Construído em um local anexo ao CIS Piraquara, o Centro Médico foi erguido pela Polícia Penal. Já a Igreja Universal vai disponibilizar médicos voluntários para atender os policiais penais na área de clínica geral. O espaço conta com um consultório médico e um odontológico.

A entrega do Centro Médico marcou um momento de valorização a todos os servidores do Departamento de Polícia Penal. O agradecimento especial foi feito à família do policial penal Lourival de Souza, que foi assassinado dentro de casa em 2018.

A esposa dele e os filhos receberam a Bandeira Nacional e flores para agradecer a dedicação e o sacrifício do servidor em prol da segurança pública. Em reconhecimento e homenagem ao servidor morto, o Centro Médico leva o nome dele.

"Temos o prazer de inaugurar essa unidade que vai beneficiar todos os policiais penais que atuam no Complexo. Os serviços serão prestados por médicos voluntários da Igreja Universal periodicamente aos sábados", explicou a diretora do CIS Piraquara, Paula Coslik. “Era uma necessidade e trabalhamos duros e integrados para conseguir”.

O bispo da Universal, Manoel Gonzalez, que participou da iniciativa, afirma que o Centro Médico marca o respeito a todos os servidores. "Temos muita admiração pelo trabalho desses profissionais e agradeço o apoio dos médicos voluntários que aceitaram a missão de cuidar da saúde desses bravos policiais penais", disse.

O secretário e as demais autoridades ainda visitaram o laboratório de informática do CIS, onde a Fanduca disponibiliza cursos de graduação de Pedagogia e Serviço Social gratuitos para as internas.

Fonte: https://www.aen.pr.gov.br

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