ARQUITETURA PRISIONAL NO BRASIL: COMO OS ARQUITETOS PROJETAM UM PRESÍDIO

e1203Parece piada, como se fala em arquitetura, se celas para 12 tem 40, 45, 50 presos, celas para 5 tem 12, 13 ou 15 presos, e ainda dizem que a arquitetura ajuda ter uma boa condição de saúde para população carcerária, com a condição que temos nem os trabalhadores do sistema prisional tem boas condições de saúde com a hiperlotação, não há arquitetura que dê jeito. Fonte do título acima e da matéria abaixo: https://revistacasaejardim.globo.com/Casa-e-Jardim/Arquitetura/noticia/2018/03/arquitetura-prisional-no-brasil-como-os-arquitetos-projetam-um-presidio.html 05/03/2018 - 17H14 - POR LUIZA QUEIROZ COM JULYANA OLIVEIRA A - A + ARQUITETURA PRISIONAL NO BRASIL: COMO OS ARQUITETOS PROJETAM UM PRESÍDIO Especialistas explicam quais são as principais preocupações quando se constrói uma unidade penal [X] Vista de cima do presídio Carandiru, hoje desativado (Foto Reprodução) Você já parou para pensar como se projeta um presídio? Além das questões de segurança, é necessário pensar em higiene, layout das celas, tamanho dos corredores, orientação dos pátios para o banho de sol. Tudo isso impacta diretamente no cotidiano daqueles que vivem lá dentro. Até dezembro de 2017, os arquitetos eram obrigados a seguir diversas regras para a construção de presídios no país, previstas na Resolução Nº 9 / 2011. Porém, o CNPCP (Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária), decidiu flexibilizar essa resolução. Antes, era obrigatório que espaços como cozinha, escola, locais de visita, lavanderias e espaços de trabalho tivessem uma área mínima proporcional ao número de presos. Com a flexibilização, essa obrigatoriedade não existe mais. A maior preocupação é a de que, sem a exigência de áreas mínimas, fique ainda mais difícil para os detentos tenham acesso à educação e ao trabalho (cujos espaços, agora, podem ser de tamanhos insuficentes para a quantidade de presidiários). Nesse contexto, buscamos entender como funciona a arquitetura prisional no Brasil e no mundo, e quais as suas diretrizes básicas. A primeira coisa a ser levada em consideração na hora de projetar uma prisão é, claro, a segurança. “Em geral, trabalhamos esse fator na arquitetura prisional considerando a resistência de materiais, sua fácil manutenção, e que não sejam inflamáveis”, explica a arquiteta, professora e da Universidade Federal do Alagoas, e ex-conselheira do CNPCP, Suzann Cordeiro. "É necessário pensar que até mesmo os materiais de construção escolhidos podem ser usados como arma", alerta a profissional. "O concreto, por exemplo, precisa de uma armação de ferro, que é instalada próximo à superfície, tornando possível os presos escavarem para tirar os vergalhões", explica. Além do concreto tradicional, a vitrificação também é usada nos presídios. Algumas empresas brasileiras usam materiais como o Glass Reinforced Concrete (GRC), uma espécie de concreto reforçado com vidro, que é mais durável e mais resistente do que o tradicional usado em projetos arquitetônicos. E o Corian, material de alta resistência composto por resina acrílica e minerais naturais. Além disso, você sabia que, extraoficialmente, presos membros de uma facção criminosa são enviados a presídios específicos? Isso significa que, quando um arquiteto esta projetando uma cárcere, ele sabe a que facção será destinada, e qual é o perfil dos integrantes. “Isso não é publicado em nenhum lugar porque eles não querem dar visibilidade ao crime organizado, mas, na prática, a gente tem que trabalhar com esse perfil. Por exemplo, o preso do Comando Vermelho é um preso mais rebelado, mais impaciente, quebra mais. Já o PCC tem um perfil mais estrategista, e eles, em geral, têm bom comportamento porque querem sair o mais rápido possível da prisão. Então, uma unidade penal dedicada a presos do Comando Vermelho, é construída com materiais mais resistentes do que no caso do PCC”, analisa Suzann. [X] Interior da Unidade Penitenciária Doutor Francisco D'Oliveira Conde, no Acre (Foto: Luiz Silveira / Agência CNJ) A arquitetura também impacta diretamente na saúde da população carcerária. Até a Resolução Nº 9 /2011 ser aprovada, não se levava em conta o norte magnético na hora de construir o presídio. Então o que acontecia era que, com os muros muito altos e os pátios muito estreitos, o sol não chegava até os presos. O layout das celas também precisa ser pensado de maneira a evitar contaminações. As janelas costumam ser pequenas e ficam acima da cabeça dos presos. Isso, associado ao fato de que as celas são estreitas, e as camas geralmente posicionadas uma em frente à outra, favorece a disseminação de doenças. “Em geral, os projetos são feitos com camas de um lado e do outro, e com uma circulação de 80 cm. Quando as pessoas se levantam, elas se aproximam a uma distância de 20 cm. Então, se alguém está infectado com tuberculose, por exemplo, ele passa para todos os demais na cela. O que temos estudado são maneiras de intercalar as camas, a fim de que quando uma pessoa levantar, não fique de frente com a outra”, conta a profissional. Veja abaixo um exemplo de layout proposto para uma cela com 6 lugares e, em seguida, um desenho retrata a disposição das celas atualmente no Brasil. [X] Layout proposto para uma cela de 6 lugares; as divisórias e a disposição das camas evitam contaminações (Foto: Suzann Cordeiro) [X] O desenho representa o layout de uma cela atual; quando se levantam, os prisioneiros ficam frente a frente e a uma distância mínima uns dos outros, evitando contaminações (Foto: Suzann Cordeiro) O desenho representa o layout de uma cela atual; quando se levantam, os prisioneiros ficam frente a frente e a uma distância mínima uns dos outros, o que possibilita contaminações (Foto Suzann Cordeiro) Mesmo com layout adequado, porém, a superlotação é um dos principais empecilhos para o desenvolvimento da arquitetura prisional no Brasil. "Não existem normas internacionais para determinar a quantidade de presos por cela. Deveria existir o bom senso. Aqui em São Paulo, eu já entrei em uma unidade em que eu contei 60 presos em uma única cela", diz Marcos Fuchs, advogado e diretor-adjunto da ONG de direitos humanos Conectas. "Enquanto lá fora, existe o princípio do cumprimento de penas em celas individuais. Isso ajuda a manter a ordem, a disciplina, e, dessa forma, todos os riscos são menores". Outra diferença com relação ao sistema prisional de outros países é a psicologia ambiental. Nos presídios dos países nórdicos, por exemplo, Cordeiro destaca o uso de cores mais alegres (ao contrário do cinza e do azul usados aqui), áreas de socialização maiores e mais confortáveis para os presos, e também a maior oferta de trabalho. Segundo dados da INFOPEN, no Brasil apenas 15% dos presos no país têm acesso a atividades laborais. Além disso, a localização dos presídios também tem impacto na arquitetura prisional e no cotidiano dos presidiários. "Nos países com baixas taxas de reincidência, você tem um modelo em que o fórum é próximo da unidade prisional. Ou seja, o juiz e o promotor visitam semanalmente as unidades. [...] Aqui, as unidades prisionais são superisoladas. Por isso, você precisa ter escolta, transporte... Fica tudo mais difícil. O juiz não visita, o promotor não visita", afirma Fuchs. [X] Interior de uma cela de presídio na Noruega (Foto: AFP) Os resultados obtidos pelo modelo adotado por países do norte europeu são significativos. A Noruega tem a menor taxa de reincidência do mundo, 20%. Já a Holanda, desde 2013, fechou 19 prisões por falta de presos. No Brasil, existe mais de uma definição para o que seria reincidência e diversos estudos calculam números diferentes, mas, em geral, acredita-se que essa taxa alcance a margem de 70%. Entretanto, já existem iniciativas nacionais que buscam uma alternativa para o sistema prisional clássico. É o caso das APACs (Associação para Proteção e Assisência aos Condenados), unidades prisionais projetadas para, em média, 200 presos, que não usam uniforme e nem algemas. "Todos circulam pela unidade e todos trabalham. A taxa de reincidência é de menos de 4%. Não tem muro alto, não tem grade. A arquitetura prisional lá funciona: tem alojamento, beliche, ventilador, cama limpa, jardinagem. É um lugar agradável, algo raro para uma unidade prisional", diz Fuchs. As APACs, entretanto, ainda são minoria no Brasil, contando com apenas 50 unidades em todo os país. Por aqui, a arquitetura penal e arquitetura de segurança em geral têm pouco destaque e raramente fazem parte da grade obrigatória nos cursos universitários de Arquitetura e Urbanismo. "Quando você diz que o espaço prisional é um espaço com o qual não devemos nos preocupar, você está segregando uma parte considerável da população. Mas é preciso lembrar que essas pessoas vão voltar para a sociedade e impactar de alguma maneira as nossas vidas", finaliza Suzann.

Fonte:  jenisandrade