Matar bandidos ou humanizar presídios?

O Estado, incompetente, responde agressões com agressões numa reedição da Lei do Talião

presos2Uma pesquisa encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança e realizada pelo Instituto Data Folha revelou que 60% dos brasileiros concordam com a afirmação de que "bandido bom, é bandido morto", frase muito propalada nas redes sociais e que desperta discussões acirradas. E os números são crescentes, o que denota a sensação de insegurança e descrédito nas instituições responsáveis pela área. Na prática, porém, há um vácuo entre a apologia à morte de bandidos e a realização do ato. Afinal, quantos realmente estariam dispostos a executarem criminosos para que se cumprisse o enunciado? O "cidadão de bem" não se disporia a sair às ruas caçando bandidos, pois, sendo "do bem", repudia a violência contra a vida. 

Quem então faria esse papel? Talvez, devêssemos instituir a pena de morte e abrir vagas em concursos públicos para o cargo de carrasco, ao qual não faltariam candidatos com perfis psicopatas, os mesmos que a população deseja eliminar. 

O fato é que a violência recrudesceu fazendo inverter o grito de "pega ladrão" para "pega polícia", provando o enfraquecimento das instituições. A população ficou entre o fogo cruzado, acuada, trancafiada em casa na esperança que surja algo como um "lava jato" geral para limpar tanto sangue das ruas. Especialistas concordam que é hora de se promover uma ampla reforma na área de segurança, o que transcende o simples combate ao crime por ação repressiva e estende-se à política de inclusão social, saúde, educação, cultura, esporte e, fundamentalmente, uma revolucionária política de humanização do Sistema Penitenciário. As primeiras medidas enunciadas atendem aos anseios imediatos da população, mas a proposta de humanizar os presídios causa ojeriza à maioria, conforme demonstrado na pesquisa. Dá quase para ouvir vozes exaltadas dizendo: "Tem pena de bandido? Leva ele pra sua casa!". 

Óbvio que não se trata de agir por pena, nem de tutelar bandidos, mas de ter uma estratégia que apresente resultados, pois o que temos é uma universidade do crime, afirmação consubstanciada pelo grande número de egressos do sistema prisional que volta a delinquir em níveis superiores nos quesitos elaboração/organização. Esse fenômeno está afeto à degradação promovida no ambiente carcerário que liquida de vez qualquer vestígio de "humanidade no homem preso". O Estado, incompetente, responde agressões com agressões numa reedição da Lei do Talião. Torturas, superlotação, ambiente infecto, abusos de toda sorte, que só ampliam a aversão pelas normas sociais e não ao contrário como se supõe. E lembremos que punições sem cominação legal, dá-se o nome de vingança. 

Nesse aspecto o tratamento humanizado nos presídios como parte da política de segurança pública é uma estratégia arguciosa e potencialmente mais barata, que contribuirá para amenizar o impacto social e econômico gerado pelo interminável ciclo do "entra bandido e sai mais bandido ainda". 

Precisamos entender que o conceito de saúde integral transcende aos aspectos físicos e pressupõe o bem-estar emocional, afetivo, psicológico, noológico e social e que o desequilíbrio nesses quesitos evidencia o adoecimento. Analogamente a qualquer doente tratado de forma deficiente, este fica predisposto a apresentar os mesmos sintomas quando retorna ao meio contaminado, além de contribuir para disseminar a "doença" da qual é portador - nesse caso a bandidagem. Intervir nessa patologia que engloba Estado, sujeito e sociedade, requer um olhar especializado e uma consideração à pessoalidade do homem apenado e não ao seu caráter criminógeno, pois por esse ele já foi julgado e sentenciado. 

Humanizar deve ser a atitude de homens humanizados, por ser moral, justa e eticamente correta, logo, que agrega todos os valores que esperamos dos bandidos que queremos matar. 

JAIR QUEIROZ é psicólogo pós-graduado em Segurança Pública e especialista em tratamento de dependentes químicos em Londrina 

Fonte: Folha de Londrina