A organização criminosa Povo de Israel — que está em expansão no Rio, conforme revelado pelo GLOBO nesta terça-feira — é alvo de uma operação das polícias Civil e Penal. Agentes da Delegacia Antissequestro (DAS) e da Subsecretaria de Inteligência e da Corregedoria da Secretaria estadual de Administração Penitenciária (Seap) deflagraram a primeira fase da Operação 13 Aldeias, resultado de uma investigação que começou há dez meses. A apuração identificou um esquema de lavagem de dinheiro por meio de laranjas e empresas fantasmas que vêm abastecendo a quadrilha.
As equipes visam a cumprir 44 mandados de busca e apreensão, bloqueio de contas correntes e respectivos ativos financeiros de 84 investigados, bem como o afastar da função pública cinco policiais penais. A diligências são realizadas em Copacabana e Irajá, na capital, e nos municípios de São Gonçalo, Maricá, Rio das Ostras, Búzios e São João da Barra, bem como no estado do Espírito Santo. A Polícia Penal também efetua ações nos presídios onde estão as lideranças desta facção.
De acordo com as investigações, o Povo de Israel surgiu em 2004, após uma dissidência de bandidos em uma rebelião. A facção criminosa conta atualmente com aproximadamente 18 mil presos — já supera, em número de integrantes nas cadeias, o Comando Vermelho (CV) e o Terceiro Comando Puro (TCP) — e ocupa 13 unidades prisionais (chamadas pelos presos de "aldeias"). Esse volume representa 42% do efetivo prisional.
De acordo com os agentes, o grupo movimentou cerca de R$ 70 milhões ao longo de dois anos, graças a recursos obtidos com os crimes de tráfico de drogas e extorsão praticada por meio de falsos sequestros. As investigações, conforme a DAS, indicam que a organização criminosa tem planos para conquistar territórios fora das penitenciárias.
Em nota, enviada nesta segunda-feira, a Seap informou que, nos últimos anos, por meio de sua Subsecretaria de Inteligência, intensificou as ações para combater as atividades ilícitas do Povo de Israel — presente em unidades de presos de perfil tido como neutro. Esse trabalho, afirmou a pasta, resultou no levantamento encaminhado para a DAS, que deu origem à investigação em curso.
"A Secretaria acrescenta que, entre os servidores citados, dois deles já respondem a processos administrativos disciplinares (PAD), e um deles se encontra preso. Sobre o episódio envolvendo uma tentativa de ingressar no Presidio Nelson Hungria com celulares dentro de uma quentinha, foi verificado que a ação partiu exclusivamente dos servidores envolvidos, tendo sido descartada a participação da empresa fornecedora de alimentação para a unidade prisional", diz o comunicado.
Ameaças a comerciantes e moradores
Além do falso sequestro, o grupo também faz ameaças a comerciantes e moradores em áreas dominadas por outras facções. As vítimas são forçadas a transferir dinheiro para contas de terceiros, que repassam os valores conforme ordens da chefia do grupo. Segundo a polícia, o lucro dos golpes é dividido em quatro partes: 30% para o “empresário”, responsável pelo celular; 30% para o “ladrão”, executor do golpe; 30% para o “laranja”, que recebe o dinheiro; e o restante vai para o caixa comum do PVI.
Esse grupo tem contribuído para a explosão de golpes no Rio. Nos primeiros nove meses deste ano, foram 109.887 ocorrências de estelionato no estado, o equivalente a um caso a cada 3,5 minutos, em média. O número é o maior desde 2003, início da série histórica, segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP). Já o número de registros de extorsão se manteve estável entre 2023 e 2024. Nos nove primeiros meses deste ano, foram 2.367 ocorrências do crime no estado, contra 2.368 no mesmo período do ano passado.
Droga em quentinhas
De acordo com a Seap, até o fim de 2022, o tráfico feito pelo Povo de Israel era restrito a pequenas quantidades dentro do sistema. Porém, desde o ano passado, grupo firmou acordos com grandes fornecedores e deu uma dimensão maior ao tráfico. Em setembro de 2023, por exemplo, a Secretaria apreendeu uma carga avaliada em R$ 1,5 milhão no Presídio Nelson Hungria, no Complexo de Gericinó.
A droga estava escondida em embalagens de quentinhas. Além dos entorpecentes, foram encontrados 71 celulares, além de carregadores e fones de ouvido. Esses aparelhos são fundamentais para a aplicação dos golpes. Entre 2023 e 2024, agentes penitenciários apreenderam 5.832 celulares nas unidades sob influência do PVI, uma média de oito por dia.
No curso das investigações, a Polícia Civil também identificou transferências suspeitas para cinco policiais penais, todos com histórico de atuação nas unidades controladas pelo Povo de Israel. Juntos, eles receberam R$ 437 mil. Um dos servidores foi preso em março do ano passado ao tentar entrar com drogas no Presídio Dalton Crespo, em Campos. Já solto, ele responde a um procedimento administrativo disciplinar (PAD). Outro foi detido em agosto deste ano com drogas e celulares na Cadeia Pública Juíza Patricia Acioli, em São Gonçalo. Este segue preso.