O serviço de vigilância particular prestado por policiais de folga, que é proibido expressamente na maior parte dos estados, alcança as vizinhanças de 18% dos brasileiros. Isso equivale a mais de 30 milhões de pessoas, segundo pesquisa Datafolha encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pela Folha.
Essa estimativa foi feita a partir de entrevistas com 2.508 pessoas com mais de 16 anos em todas as regiões do Brasil, entre os dias 11 e 17 de junho. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
O serviço, que costuma ser proibido no regulamento interno das polícias, pode ser ainda mais disseminada no país. Isso porque Datafolha perguntou especificamente sobre "a oferta de serviços de vigilância privada prestados por policiais de folga", e é provável que boa parte dos entrevistados não saiba se os vigilantes em seus bairros são policiais do serviço ativo ou não.
"Não há dúvida que essa é uma estimativa conservadora", escreve o cientista político Cleber Lopes, professor da Universidade Estadual de Londrina e pesquisador do Fórum, que analisou os números da pesquisa em um artigo. "Como o bico na segurança é uma atividade irregular, os policiais prestam serviços de maneira velada, isto é, sem uniforme e com a arma encoberta, o que cria dificuldades para a sua identificação pelas pessoas."
Os dados do Datafolha apontam que essa situação é mais comum nas regiões metropolitanas, especialmente cidades a partir de 200 mil habitantes em todo o país. No interior, 16% dos moradores dizem que em seus bairros há essa atividade, contra 21% nas metrópoles.
Segundo a pesquisa, entrevistados que moram em bairros com vigilância particular feita por policiais também relatam com mais frequência terem presenciado violência policial. Nos bairros com vigilantes, 19% relatam ter visto abordagens violentas nos últimos meses. Entre os demais, 14% dizem o mesmo.
É mais do que a soma de todas as forças de segurança pública do país, que somavam 796.180 profissionais no ano passado, segundo levantamento do Fórum. É de conhecimento público que parte deles trabalham ao mesmo tempo na segurança particular.
Essa dupla jornada leva a preocupações com a saúde mental dos policiais e suas consequências para a segurança pública. "O bico policial na segurança privada compromete a qualidade dos serviços de segurança pública, criando conflitos de interesse, aumentando o estresse do policial e sua chance de vitimização", escreve Lopes.
"É um estressor adicional que impacta diretamente a vitimização por suicídio, que em 2023 foi a principal causa de morte de policiais no Brasil, superando as mortes por confronto na folga e por confronto no serviço", afirma.