O então juiz federal Odilon de Oliveira, da 3ª Vara Federal de Campo Grande, até 2017, ano que se aposentou, consagrou-se nas três décadas de atividades judiciais como um dos magistrados brasileiros que mais sentenciou traficantes de drogas no País. Era temido, em tribunais, por chefões do narcotráfico e alvo de algozes que o quiseram morto.
Sob forte aparato de segurança, policiais federais, Oliveira sobreviveu a sanha dos criminosos. Sem a toga, a beca que o tornou celebridade ao virar tema de filme, o magistrado deu uma revirada desvairada em seus deveres profissionais. Odilon de Oliveira agora é advogado criminalista e, na lista da clientela que defende desponta até figuras importantes do mundo do tráfico de droga.
Antes de encarar a nova missão na advocacia, o juiz aposentado encarou uma dura eleição estadual e, por pouco não virou governador de Mato Grosso do Sul em sua primeira investida na esfera política. Ele perdeu a disputa no 2º turno para Reinaldo Azambuja (PSDB).
Um dos clientes de Oliveira chama-se Hermógenes Aparecido Mendes Filho, 49 anos. Na última década, o réu por tráfico de droga saiu da condição de açougueiro que tocava num bairro da cidade de Dourados para a de dono de propriedades rurais, na cidade onde mora e também no vizinho Mato Grosso, onde é dono de fazenda.
Para a Polícia Federal, o traficante teria ligação com o chamado Comando Vermelho, renomada organização criminosa surgida no Rio de Janeiro.
Noutros tempos, Oliveira poderia sentenciá-lo a pena que, rotineiramente superava a casa dos 10, 15, 20 anos de cadeia. Hoje, no entanto, é missão dele defender o traficante e, se possível, livrá-lo da prisão. Fernandinho Beira-Mar, um dos chefes do Comando Vermelho, traficante famoso com pena que supera a casa dos 300 anos, foi um dos réus sentenciado por Odilon.
E, como enxerga o magistrado aposentado seu instante profissional hoje em dia?
“Advogado não defende o crime, defende a pessoa com base na lei”, respondeu Oliveira numa entrevista publicada semana passada no site Campo Grande News.
Doze atrás, em 2012, em material publicado no UOL, produzida por este repórter, o então juiz Odilon de Oliveira, de dentro de gabinete, na 3ª Vara Criminal, narrou como era a rotina de um magistrado jurado de morte por discórdias acerca das condenações definidas por ele contra criminosos que viviam do tráfico de droga.
O aposentado e o agora advogado criminalista revelou que já há década vivendo cercado de seguranças, os policiais federais que o cuidam, ainda o incomodavam.
“Desde que sou protegido, até meus sonhos, quando durmo, mudaram. Às vezes, sonho que estou fugindo dos policiais, pulando o muro de minha casa, depois bate um desespero, cadê os policiais? Mesmo quando sonho com outra coisa, vejo, na cena, um policial, é um tormento”, disse ele, à época.
Odilon disse que os policiais federais que cuidavam de sua seguravam moravam numa guarita, em sua casa, e lá ficavam o tempo todo. Odilon disse que policiais andavam o tempo todo armados com submetralhadoras e pistolas, mas ele, embora tivesse, não usava arma alguma.
“Tenho uma, mas não uso porque não sei usar, não saberia me defender. Arma deve ser usada por quem sabe, apenas”, afirmou o magistrado aposentado.
À época da entrevista, Odilon de Oliveira disse que havia ingressado na magistratura federal em 1987 e, além de Campo Grande, havia atuado também em Cuiabá (MT) e Porto Velho (RO) e que a primeira de uma série de ameaças de morte que sofrera, ele recebeu em 1998, 11 anos depois de ingressar na carreira.
Desde então, a escolta passou a ser parte de sua rotina. Ele revelou, também, as ameaças surgiam por meio de telefonemas, depoimentos de presos, cartas e até por e-mail.
Houve também, disse ele, situações mais graves. Certa vez, em Ponta Porã, município no sudoeste de Mato Grosso do Sul, separado do município paraguaio de Pedro Juan Caballero por apenas uma rua, um homem tentou invadir o hotel onde morava o juiz.
Odilon disse ainda que em outra ocasião, também em Ponta Porã, três pistoleiros que aguardavam, que saia para a academia de ginástica. “Por sorte, minha escolta abortou o ataque e mais uma vez os pistoleiros conseguiram escapar”, narrou.
Cálculos do juiz
A época da publicação, em agosto de 2012, o juiz disse acreditar que as ameaças eram feitas por pessoas ligadas ao crime organizado. Em suas contas, ele já teria determinado o confisco de cerca de R$ 2 bilhões dos chefões do tráfico internacional de drogas.
Dinheiro de réus ligados a crimes de lavagem de dinheiro e, principalmente, tráfico de drogas. Na relação dos bens apreendidos estão 151 imóveis rurais, 883 veículos, 25 aviões e 16 mil cabeças de gado.
Odilon afirmou ainda que se não temia os frequentes ataques: “Acho que o juiz não deve temer nada, os criminosos devem ser punidos com rigor e a legislação brasileira, mudar, porque é fraca, favorece o crime organizado”.
À época, Odilon mostrava-se entusiasmo com a carreira judicial. Tanto que, segundo ele, mesmo em férias, reservava dois da semana para por em dias os processos cuidados por ele. Dois anos atrás, em 2022, a história do juiz aposentado virou documentário produzido pela HBO Max.
Já o filme “Em nome da lei”, é o nome da obra que conta a história do juiz, vivida na tela pelo ator global Mateus Solano.