Câmeras de uniformes apontam extorsão, tortura e outros supostos crimes de PMs no RJ

Rio de Janeiro

A câmera presa na farda de um policial mostra que ele está com um fuzil em uma viela de Araruama, na Região dos Lagos do Rio de Janeiro. Ele se depara com um jovem que aponta uma pistola prateada.

Sem atirar, o agente consegue controlar a situação; o jovem se rende e é algemado. O policial, no entanto, virou réu em agosto deste ano: as imagens gravaram o diálogo que ele teve com o suspeito já algemado e flagraram o momento em que ele se apropria de R$ 100.

Essa é uma das primeiras denúncias que utilizaram câmeras corporais de policiais militares como prova para a indiciação em um crime no Rio. O caso acima ocorreu em outubro de 2023. O preso foi apresentado à delegacia, mas o dinheiro que estava com ele, supostamente do tráfico de drogas, não.

Policiais trabalham no CICC (Centro Integrado de Comando e Controle) da Polícia Militar do Rio de Janeiro - Eduardo Anizelli/Folhapress

Ao chegar na audiência de custódia, o suspeito disse que fora agredido pelo agente. A promotoria pediu as imagens para averiguar a denúncia. Não havia agressão, e as imagens mostravam a conversa entre o preso e o policial.

Nela, o suspeito afirma que o policial já o ajudou em outra ocasião, que dinheiro não é problema. O agente diz que o conhece de algum lugar e fala para ele ficar em silêncio por conta da câmera.

Com a insistência do preso em querer negociar, o policial pede para ele ter calma, e então pega o dinheiro que estava na mochila.

"Essa denúncia é um dos primeiros casos em que a câmera foi usada para provar a prática de um crime, que no caso nem havia sido denunciado. A câmera mostrou o momento em que o policial pratica peculato", afirmou o promotor Paulo Roberto Mello Cunha Jr.

Desde 2021 o estado tem uma lei que determina a instalação de câmeras no uniforme de policiais, mas ela só passou a ser cumprida em sua totalidade após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), em janeiro deste ano.

De acordo com o promotor, em alguns casos os policiais passaram a tapar ou deixar o equipamento na viatura. Também há casos de agentes que usam cabos de celular para descarregar a bateria.

"Não há um crime tipificado para essas ações. Mas entendemos que como existe uma resolução da PM sobre a obrigatoriedade do equipamento, o descumprimento dela recai no crime de recusa a obedecer uma ordem, crime militar com pena prevista de detenção de 1 a 2 anos", disse Mello Cunha Jr.

O primeiro caso denunciado pela recusa de obediência ocorreu em Itaboraí, na região metropolitana da capital; os réus são quatro policiais. As imagens mostram quando eles entram no terreno de uma casa sem permissão após terem visto um homem correndo.

Era 8h30, e apontando um fuzil eles dão bom dia aos moradores de uma casa. Em seguida, entram em outra residência, onde está um homem deitado na cama com a filha de sete anos. A criança, assustada, se enrola no lençol e fica em um canto do quarto, enquanto o pai é revistado.

Os agentes, então, passam a entrar e sair da residência sem as câmeras —uma imagem mostra que um dos policias ficou do lado de fora da casa, com duas câmeras na farda. Um dos equipamentos era de um agente que estava no interior da residência com o suspeito.

Após cerca de 30 minutos, os agentes afirmam que encontraram drogas no terreno e o homem diz, já sendo filmado, que seria traficante de drogas.

A promotoria entendeu neste caso que houve "abuso de poder e violação inerente ao cargo, em serviço", após a entrada sem ordem judicial na residência. Outra denúncia foi oferecida em separado por eles terem tirado a câmera.

Em outro caso, as imagens flagram agentes que estavam na Lei Seca confessando a um superior que extorquiram uma motorista em R$ 300. A motorista havia procurado outra viatura para denunciar o crime. O policial preso chega a pedir a um superior para devolver o dinheiro e assim resolver o caso, mas o capitão diz que que ele está com a câmera e será conduzido para a corregedoria.

Imagens de uma suposta tortura também estão sendo analisadas pela promotoria. Nelas, dois policiais batem em um suspeito de roubo. Na sequência, os agentes permitem que outras pessoas continuem as agressões.

Em alguns casos as imagens foram usadas para provar a inocência de falsas acusações contra policiais. É o que ocorre quando presos afirmam em audiência de custódia que foram agredidos para tentar tornar a prisão ilegal, mas as câmeras mostraram a legalidade das ações.

As imagens não podem ser acessadas pelos policiais militares e são vistas ao vivo pela corregedoria. A câmera funciona como uma espécie de rádio. Testes são feitos aleatoriamente, chamando o policial pelo nome.

O promotor considera impossível acompanhar todos os diálogos. "Mas com a câmera, se um policial cometer um desvio de conduta a chance dele ser indiciado será maior. Aquele agente que pega um dinheiro a primeira vez e nada ocorre, depois pega a segunda...uma hora ele será flagrado pela corregedoria nas câmeras e será preso", afirma.

Em nota, a Polícia Militar afirmou que "a implantação das câmeras corporais é um dos principais pilares do programa de transparência na área de segurança pública. Implantadas ao longo de 2022 e hoje disponibilizadas em todas as unidades operacionais da corporação, as quase 13 mil câmeras em operação registram a atuação diária dos policiais."

Uso das câmeras corporais pela PM é apoiado por 88% dos moradores de SP
Uso das câmeras corporais pela PM é apoiado por 88% dos moradores de SP

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2024/09/cameras-de-uniformes-apontam-extorsao-tortura-e-outros-supostos-crimes-de-pms-no-rj.shtml

Caso Bruno: delegado Edson Moreira revela detalhes sobre assassinato de Eliza Samúdio

e0930 O delegado Edson Moreira, responsável pela investigação do caso Bruno e Eliza Samúdio, concedeu uma entrevista à Rádio Itatiaia, revelando detalhes sobre um dos crimes mais notórios da história recente do Brasil. O caso, que ganhou proporções internacionais em 2010, envolveu o então goleiro do Flamengo, Bruno Fernandes, no assassinato de Eliza Samúdio.

Moreira relembrou o impacto imediato que o caso teve na mídia: ‘Na época, eu tinha dois telefones. Tive que entregar para a secretária atender, porque na segunda-feira eles já não paravam de tocar’. A declaração ilustra a intensa pressão e atenção midiática que o caso recebeu desde o início.

O mistério do corpo de Eliza

O delegado abordou um ponto crucial que permanece sem solução até hoje: a localização do corpo de Eliza Samúdio. ‘Tem uma coisa que podia ajudar, né, onde está o corpo da Eliza Samúdio’, afirmou Moreira, sugerindo que essa informação poderia trazer novos desdobramentos ao caso.

Moreira ainda especulou sobre possíveis cenários para a resolução deste mistério: ‘Quem sabe o Bruno fazer uma reflexão e falar onde está. Ou então a pessoa que ajudou o Bruno a enterrar lá. Nem que seja anonimamente’. Estas declarações indicam que, mesmo após mais de uma década, as autoridades ainda buscam encerrar definitivamente o caso.

O caso Bruno e Eliza Samúdio chocou o Brasil não apenas pela brutalidade do crime, mas também pelo envolvimento de uma figura proeminente do futebol brasileiro. Bruno Fernandes, que à época era goleiro do Flamengo e considerado uma das maiores promessas do futebol nacional, foi condenado pelo assassinato de Eliza Samúdio, com quem tinha um filho.

A entrevista do delegado Edson Moreira à Itatiaia reacende o debate sobre um dos casos mais emblemáticos da crônica policial brasileira, destacando que, apesar da condenação, ainda há questões não resolvidas que continuam a intrigar tanto as autoridades quanto a opinião pública.

Fonte: https://www.itatiaia.com.br/cidades/2024/09/29/caso-bruno-delegado-edson-moreira-revela-detalhes-sobre-assassinato-de-eliza-samudio

Policiais lucram R$ 15 mi para engavetar ação contra narcotraficantes

e0927 A Força Tarefa de Combate ao Crime Organizado (Ficco-SP) realiza, na manhã desta terça-feira (3/9), a Operação Face Off, com o objetivo de reprimir crimes de corrupção ativa e passiva e de lavagem de dinheiro praticados por narcotraficantes internacionais e policiais civis de São Paulo.

Na operação, que conta com a participação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e com o apoio da Corregedoria da Polícia Civil paulista, são cumpridos 10 mandados de busca e apreensão e quatro de prisão preventiva nas cidades de São Paulo (SP) e Arujá (SP).

Além dos mandados de busca e de prisão, foram decretadas ordens judiciais de sequestro de bens imóveis e veículos, assim como bloqueio de valores em contas bancárias.

Nas diligências, foi apurado que dois narcotraficantes, vinculados a uma organização criminosa responsável pelo envio de diversas cargas de cocaína ao exterior, principalmente para a Europa, pagaram propina de R$ 800 mil a investigadores da Polícia Civil de São Paulo em novembro de 2020.

Segundo a Ficco-SP, houve também pagamentos mensais, de valores ainda não determinados, ao menos até o primeiro semestre de 2021.

O pagamento da propina, que foi intermediada por advogados dos narcotraficantes, resultou à época no arquivamento de uma investigação que estava em curso no Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcotráfico (Denarc), que apurava a atuação da organização criminosa no tráfico internacional de drogas.

No inquérito policial também é apurado o crime de lavagem de dinheiro cometido pelos narcotraficantes, pelos policiais civis investigados e pessoas a eles associadas (“testas de ferro” ou “laranjas”).

A Justiça determinou o sequestro e bloqueio de valores em contas bancárias até o limite de R$ 15 milhões. Foi deferido ainda o sequestro de veículos pertencentes aos investigados com valor aproximado de R$ 2,1 milhões (tabela Fipe), e de imóveis cujo valor de mercado está estimado em cerca de R$ 8 milhões.

O nome da Operação Policial, “Face Off”, remete ao filme A Outra Face, de 1997, em que um policial e um criminoso literalmente trocam de rosto.

Fonte: https://www.metropoles.com/distrito-federal/na-mira/policiais-lucram-r-15-mi-para-engavetar-acao-contra-narcotraficantes

Professora é denunciada por assediar aluna de 13 anos no Paraná

e0924 O Ministério Público do Paraná, por meio da 2ª Promotoria de Justiça de Campo Largo, na Região Metropolitana de Curitiba, ofereceu denúncia criminal contra uma professora por assédio sexual. A denúncia aponta que em duas ocasiões, em dezembro do ano passado, a professora teria assediado uma aluna de 13 anos, enviando-lhe imagens de cunho pornográfico e solicitando que a vítima lhe enviasse vídeos de conteúdo sexual.

O crime de assédio sexual (artigo 2167-A do Código Penal) tem pena prevista de detenção de um a dois anos, aumentada em até um terço se a vítima tem menos de 18 anos, como é o caso denunciado. O Judiciário recebeu a denúncia nesta quarta-feira, 18 de setembro – o processo corre sob sigilo.

Advogada de Deolane é investigada pela PCDF por golpe com "Jogo do Tigrinho"

Além de representar Deolane, Adélia Soares ficou famosa ao participar do BBB -  (crédito: Reprodução/Instagram/WhatsApp) Advogada da influenciadora Deolane Bezerra, a ex-BBB Adélia Soares é citada em um relatório investigativo da Polícia Civil do Distrito Federal, ao qual o Correio teve acesso, por suposta participação em um esquema criminoso chinês. A facção operava cassinos ilegais no Brasil, entre eles o famoso "Jogo do Tigrinho".

A investigação começou com um golpe financeiro aplicado em um morador do Lago Norte, em Brasília. No curso das apurações, a polícia desvendou um esquema chinês de empresas que usavam CNPJs de companhias brasileiras para acessar o sistema financeiro do país sem autorização do Banco Central. Os valores conquistados pelo sistema eram enviados para paraísos fiscais.

De acordo com a Polícia Civil, os jogos ilegais promovidos pelo grupo utilizam algoritmos manipulados para que os jogadores "percam mais".

Adélia Soares se apresentou aos investigadores como advogada da empresa OKPAYMENTS, banco que possibilitava a ação de uma das companhias criminosas no país. Em seguida, ela negou conhecer os donos da empresa. Adélia também consta como administradora de uma outra companhia, nomeada PlayFlow Processadora de Pagamentos Ltda, criada em 11 de julho.

Aos policiais, Adélia negou ser dona da PlayFlow e parou de responder os contatos dos agentes, mesmo sob intimação.

  • Diálogo de Adélia Santos com os investigadores
  • Diálogo de Adélia Santos com os investigadores
  • Diálogo de Adélia Santos com os investigadores

"As claras falsidades da advogada Adélia de Jesus Soares, seu desaparecimento após os questionamentos e seu nome como administradora da PlayFlow demonstram inquestionavelmente que ela também foi cooptada a abrir empresas de fachada para o grupo criminoso chinês. A empresa PlayFlow foi aberta de maneira totalmente irregular, tendo sido juntado um pdf inválido em inglês de supostos atos constitutivos de uma empresa sediada na Ilhas Virgens Inglesas e a Playflow foi criada na JUC-SP como sendo uma representante dessa empresa internacional chamada PEACH BLOSSOM RIVER TECHNOLOGY LTD", diz o relatório.

Ademais, o documento reafirma que Adélia Soares é advogada "e não pode alegar desconhecimento da lei e do tramite para constituição de uma empresa estrangeira no Brasil".

Em nota à colunista Mariana Moraes, do Correio Braziliense, a defesa de Adélia informou que ela está "plenamente ciente dos fatos mencionados e já tomou todas as providências legais cabíveis", entre elas o registro de boletins de ocorrência para "proteger sua identidade e reputação". 

“As acusações feitas contra ela são infundadas e resultam de um golpe praticado por terceiros, que utilizaram seu nome de forma indevida e criminosa. A Doutora Adélia informa que está colaborando ativamente com as autoridades para esclarecer os fatos e responsabilizar os verdadeiros culpados, uma vez que apenas prestou suporte administrativo para a empresa em questão", completou.

Fonte: https://www.correiobraziliense.com.br/brasil/2024/09/6941144-advogada-de-deolane-e-acusada-de-envolvimento-em-faccao-do-jogo-do-tigrinho.html

Depoimento de Anielle revela detalhes da acusação contra Silvio Almeida

e0916 Anielle Franco escolheu um restaurante reservado, relativamente afastado da região mais movimentada de Brasília, para uma conversa que deveria ser definitiva. Desde que assumiu o comando do Ministério da Igualdade Racial, no início de 2023, ela vinha sendo alvo de constrangimentos e importunações por parte de um colega, o ministro Silvio Almeida, dos Direitos Humanos. Os dois se conheceram durante o período de transição de governo e se aproximaram muito depois da posse. Aos poucos, as conversas descontraídas do início da relação foram dando lugar a investidas de conotação sexual. O ministro mirava Anielle com olhares enviesados, fazia “elogios” inconvenientes, sussurrava fantasias eróticas nos ouvidos dela e, na mais ousada das incursões, chegou a repousar a mão entre as pernas da ministra. O encontro no restaurante foi a última tentativa de Anielle de colocar um ponto-final em uma situação “insustentável”, que já havia chegado ao conhecimento de outros ministros, de assessores importantes do Palácio do Planalto e do próprio presidente da República. Ela tentou evitar que o caso se transformasse em um escândalo, mas, segundo seu relato, não deu certo.

arte conversa whatsapp

Na sexta-feira 6, Silvio Almeida foi demitido depois que o site Metrópoles revelou que a ONG Me Too Brasil havia recebido denúncias de assédio sexual contra ele e que Anielle seria uma das vítimas. Pouco antes de perder o cargo, o ministro negou as acusações, se disse vítima de perseguição, exibiu um conjunto de mensagens que atestariam que mantinha apenas uma relação cordial com a ministra e citou o encontro no restaurante como prova de sua inocência. O que Almeida não sabia é que Anielle já havia dado um detalhado depoimento sobre o caso, inclusive sua versão para o encontro no restaurante. Diante dos ministros Vinícius Marques de Carvalho (Controladoria-Geral da União), Jorge Messias (Advocacia-­Geral da União), Cida Gonçalves (Mulheres) e Esther Dweck (Gestão), Anielle confirmou que era assediada “há vários meses”, relatou diferentes episódios em que o colega se dirigia a ela com palavras de “lascívia” e descreveu cenas em que teve os ombros e as costas apalpadas de forma abso­luta­mente inapropriada. Confirmou também ter ficado totalmente “desconcertada” num dia em que Almeida tocou suas partes íntimas por baixo da mesa, durante uma reunião de trabalho e na presença de várias autoridades.

NO MINISTÉRIO - Importunação: ministra disse que teve as partes íntimas tocadas durante uma reunião
NO MINISTÉRIO - Importunação: ministra disse que teve as partes íntimas tocadas durante uma reunião (Thayane Alves/.)

No depoimento, a ministra descreveu as diversas agressões de que era alvo e explicou o contexto em que aceitou jantar com o colega, mesmo depois de tudo que ele já havia feito. Conta que o convite partiu dela e o obje­ti­vo era tentar convencer o colega a mudar o comportamento e evitar um escândalo que poderia comprometer a carreira de ambos. Foi, de fato, um jantar cordial, como disse o ministro em sua versão. A certa altura da conversa, Almeida reconheceu ter passado do ponto e até lamentou. Na saída do restaurante, porém, o ministro teria se aproximado de Anielle e, como se nada tivesse acontecido, sussurrado no ouvido dela um desejo — uma expressão impublicável. No relato que fez aos colegas de ministério, Anielle ressaltou que, mesmo sofrendo importunações sexuais de maneira recorrente havia mais de um ano, não tinha formalizado a denúncia por medo de ser desacreditada e perder o cargo por não ter como comprovar as acusações — um problema enfrentado pela grande maioria das vítimas de assédio. “Como são crimes que quase sempre não deixam vestígios materiais, temos a palavra de um contra a palavra do outro”, ressalta a ex-promotora Gabriela Manssur, especialista em defesa dos direitos das mulheres.

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Silvio Almeida negou todas as acusações e se disse vítima de uma armação política. Antes de ser demitido, ele também foi ouvido pelos colegas do governo. O ministro relatou que havia uma disputa por protagonismo com Anielle em relação à luta contra o racismo, mas que isso, embora tenha gerado algumas rusgas, nunca atrapalhou a boa relação entre eles. Pelo contrário. Os dois conversavam com frequência, tinham certa intimidade e projetos comuns. Para provar o que dizia, Almeida selecionou um conjunto de mensagens que ele trocou com a ministra de novembro de 2022 a março de 2024. Os diálogos, segundo ele, mostram uma relação que seria incompatível entre uma vítima de assédio e seu pretenso algoz. Há juras de fidelidade, demonstrações de carinho e elogios mútuos. “Quero ser seu parceiro, a pessoa em que você pode confiar. Eu não estava bêbado quando conversamos ontem no avião do PR…”, escreveu ele em agosto do ano passado. Os dois haviam acabado de voltar de uma viagem oficial fora do país. “Minha admiração por você é imensa. A última coisa que eu quero é que a gente se dê mal”, respondeu Anielle. Na ocasião, eles combinaram um jantar para “afinar os ponteiros”. “Eu quero recomeçar com você”, ressalta Almeida. “Eu também”, responde Anielle. Dias depois, a ministra envia uma foto de ambos. O ministro comenta: “Somos lindos, Anielle!”. E acrescenta: “Esse seu vestido é deslumbrante”. “Ficou muito f. né!?”, ela concorda, sugerindo uma legenda para a imagem: “Lindos, negros, competentes e ainda ministros”. No dia em que a ministra afirma ter sido surpreendida pela mão boba do ministro, há o registro de uma ligação não atendida dela para ele após a reunião.

NO RESTAURANTE - Jantar: outra investida ao tentar convencer o colega a mudar o comportamento
NO RESTAURANTE – Jantar: outra investida ao tentar convencer o colega a mudar o comportamento (@brasiliapalace/Instagram)

Os rumores sobre o assédio à titular da Igualdade Racial já circulavam por vários gabinetes importantes de Brasília, incluindo o do presidente da República. Alguns ministros sabiam de detalhes. Porém, como a acusação de assédio não havia sido formalizada, auxiliares de Lula tentaram contornar o problema para evitar os danos políticos que a denúncia certamente provocaria. Amiga de Anielle Franco, a primeira-dama, Janja da Silva, entrou no circuito e ouviu da própria ministra detalhes das importunações sexuais. Anielle, porém, não estava disposta a levar o caso adiante, e pela versão de Almeida nada tinha acontecido, portanto, melhor deixar como estava. Nas últimas semanas, os dois nem se cumprimentavam mais. Um dia antes da eclosão do escândalo, eles compareceram a um evento oficial. Sequer se olharam, e Anielle deixou o local antes de o ministro discursar. Uma dificuldade comum em investigações de crimes de assédio e importunação sexual é a produção de provas. As abordagens normalmente são feitas quando a vítima está sozinha ou longe de ambientes públicos. As falsas acusações são raras, mas também existem.

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CASO ENCERRADO - Lula e Macaé, a nova ministra dos Direitos Humanos: rumores circulavam pelo Planalto havia meses
CASO ENCERRADO - Lula e Macaé, a nova ministra dos Direitos Humanos: rumores circulavam pelo Planalto havia meses (Ricardo Stuckert/PR)

A denúncia contra o ministro foi publicada na noite da quinta-feira 5. Horas depois, ainda durante a noite, ele foi instado a prestar esclarecimentos. Em seu depoimento, relatou aos ministros Vinícius Marques de Carvalho, Jorge Messias e Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social) que as acusações, além de infundadas, eram fruto de uma disputa política entre militantes de pautas identitárias e fariam parte de um movimento para desacreditá-lo, orquestrado por um advogado ligado ao Grupo Prerrogativas. Durante a madrugada, Almeida procurou amigos para se aconselhar. A dois deles disse que estava propenso a tirar a própria vida. Não parecia blefe. Desorientado, repetia que a vida pessoal e a carreira profissional estavam arruinadas. Um advogado indicou um psiquiatra e outro o aconselhou a deixar o cargo para se dedicar a preparar sua defesa e evitar constrangimentos ao governo. Mais calmo, ainda na madrugada, ele ligou para um assessor do presidente da República para comunicar a decisão. Era tudo que o Planalto queria.

SOLIDARIEDADE - Janja: primeira-dama ouviu o relato direto de Anielle
SOLIDARIEDADE - Janja: primeira-dama ouviu o relato direto de Anielle (@janjalula/Instagram)

Lula não precisaria assumir o desgaste de demitir o ministro e apagaria o incêndio em poucas horas. Ficou acertado que Almeida iria conversar com o presidente ainda naquele dia e anunciaria sua demissão. O ministro, porém, mudou de ideia. Antes do encontro com o presidente, ele divulgou uma nota afirmando que as acusações contra ele eram “ilações absurdas”, acusou o grupo Me Too de ter tentado interferir em uma licitação e informou que pediria que o Ministério Público e órgãos do governo fizessem uma “apuração rigorosa” do caso. Na audiência com Lula, disse que não pediria demissão, reafirmou a inocência e tentou mostrar as provas de que dispunha: o vídeo do tal jantar com Anielle e as mensagens de WhatsApp trocadas com a ministra. Lula ouviu as explicações, mas já tinha o veredicto. A nova ministra dos Direitos Humanos, Macaé Evaristo, vai tomar posse na próxima semana. Para o Planalto, o caso está encerrado.

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